Por que a guerra comercial derrubou os preços do petróleo?
14 de abril de 2025A sequência de anúncios sobre tarifas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, jogou os mercados financeiros em uma montanha-russa nos últimos dias, mas uma commodity em particular emergiu como uma das principais vítimas: o petróleo.
O preço do contrato Brent, usado como referência inclusive pela Petrobras, já vinha em queda desde a volta de Trump à Casa Branca, em janeiro. No entanto, após o republicano anunciar generalizadas tarifas recíprocas na semana passada, o ativo despencou ao menor nível em quatro anos.
O barril do Brent agora tem operado perto da faixa dos US$ 60, nos patamares mais baixos desde o choque causado pela pandemia de covid-19, no começo de 2020.
A guerra tarifária entre EUA e China pressiona as expectativas de crescimento econômico global, enquanto a incerteza geral sobre o comércio pesa fortemente no preço do petróleo.
Mais do que as tarifas por si só, investidores temem o quadro contínuo de dúvidas sobre a retaliação dos países envolvidos, avalia Carole Nakhle, CEO da consultoria de energia Crystol Energy.
"Acrescente-se o fato de que isso acontece enquanto a demanda por petróleo já não estava crescendo enquanto a oferta é abundante e o resultado são os níveis de preços que estamos observando agora", explica.
Choque da Opep+
Para agravar o cenário, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados (Opep+) provocou mais um grande choque nos mercados no dia seguinte ao anúncio de Trump. O grupo formado por 12 membros do cartel mais outros 10 grandes exportadores informou que aumentaria a oferta da commodity significativamente a partir de maio.
Sob a liderança de Arábia Saudita e Rússia, a Opep+ vinha limitando a produção petrolífera na última década para manter os preços elevados. A expectativa era pela manutenção dessa postura.
Mas analistas acreditam que a mudança repentina é uma tentativa de controlar países como Cazaquistão e Iraque, que desrespeitaram o acordo aos produzir mais do que o combinado.
Essas nações "esgotaram a paciência dos membros mais disciplinados", que estavam "carregando o fardo dos cortes" na oferta há algum tempo, afirma Nakhle.
O Cazaquistão, por exemplo, irritou a Arábia Saudita ao ampliar a produção no campo de petróleo de Tengiz, no noroeste do país. Já o Iraque reduziu a oferta recentemente, mas não prometeu compensar o descumprimento de suas cotas nos últimos anos.
Para Nakhle, a aliança está preparada para um ambiente de longo prazo de preços mais baixos. "A Opep+ acredita que seria melhor para alguns membros, especialmente aqueles que investiram pesadamente na expansão de sua capacidade de produção, protegerem sua participação de mercado", ressalta.
Nakhle acrescenta que a organização pode estar se posicionando para uma redução da oferta de membros como Rússia, Venezuela e Irã por conta de fatores geopolíticos, como sanções e uma possível operação militar contra os iranianos. "Então, o mercado pode absorver os barris adicionais sem sucumbir os preços", diz.
Preocupação no Kremlin
Trump tem promovido a queda nas cotações do petróleo como um reflexo do sucesso de suas políticas, essencial para o alívio no valor da gasolina nas bombas. "Temos tudo [os preços] em níveis que ninguém nunca achou ser possível”, escreveu na rede social Truth Social.
Vários analistas, porém, veem o movimento como um sinal de preocupação sobre o estado da economia mundial. O banco de investimentos americano Goldman Sachs prevê que o Brent pode cair abaixo de US$ 40 por barril até o final de 2026 em um "cenário extremo”.
Para a Rússia, em particular, o quadro teria profundas consequências políticas e econômicas. O país conseguiu resistir a sanções do Ocidente desde o começo da guerra na Ucrânia, em fevereiro de 2022, em parte, por conta da escalada dos preços do petróleo, que impulsiona as receitas domésticas.
Na visão de especialistas, a reversão dessa tendência teria impacto considerável nos planos orçamentários e de gastos do Kremlin, o que poderia levá-lo a repensar a campanha militar em andamento.
As despesas com defesa mais que triplicaram desde 2021 e devem atingir um recorde de 13,5 trilhões de rublos (R$ 960 bilhões) no orçamento de 2025, com um aumento de 25%.
De acordo com dados compilados pela agência de notícias Reuters, o preço do petróleo dos Urais, referência para a Rússia, caiu a US$ 53 no final da semana passada.
Chris Weafer, consultor de investimentos que vive e trabalha na Rússia há mais de 25 anos, disse à DW que a eventual persistência dessa queda forçará o Banco Central russo a "enfraquecer significativamente o rublo" e possivelmente também obrigará o governo a reduzir seus planos de gastos.
Weafer reconhece que petróleo não representa mais a mesma parcela das receitas russas que antes, caindo de cerca de 50% há uma década para cerca de 30% hoje. Mesmo assim, uma baixa sustentada nos preços teria um grande impacto em todos os aspectos da política do Kremlin, afirma.
O governo russo não teria "dinheiro sobrando” se essas receitas desabassem mais. "A posição financeira da Rússia parecerá muito menos segura, talvez dentro de um ano, e isso claramente poderia minar a capacidade da Rússia de negociar um acordo em relação à Ucrânia", acrescentou.