Merz é criticado na Alemanha por fala sobre "trabalho sujo"
18 de junho de 2025O chanceler federal da Alemanha, Friedrich Merz, sofreu fortes críticas de quadros políticos do país após afirmar que Israel faz o "trabalho sujo" para o Ocidente ao mirar o programa nuclear iraniano em ataques sem precedentes que passaram a atingir também áreas residenciais no Irã.
"Este é o trabalho sujo que Israel faz para todos nós", disse Merz na terça-feira (17/06) à emissora alemã de TV ZDF. "Só posso dizer [que temos] grande respeito pelo fato de o Exército israelense e o governo israelense terem a coragem de fazer isso", acrescentou, em entrevista concedida no Canadá, onde participou da cúpula do G7.
O Irã chegou a convocar o embaixador alemão no país para protestar contra o que chamou de "comentários ofensivos" de Merz.
O conflito entre Irã e Israel, que já dura seis dias, deixou mais de 200 mortos no lado iraniano e 24 no lado israelense, segundo autoridades, além de centenas de milhares de feridos. Também provocou cenas caóticas em Teerã, de onde milhares de civis fugiram.
A declaração de Merz foi rechaçada por políticos alemães, incluindo membros do Partido Social-Democrata (SPD), sigla que compõe o governo de coalizão. Para muitos, a mudança de tom do chanceler rompe com a tradição diplomática alemã, desconsidera vítimas civis e contraria o direito internacional.
Declaração "extremamente perigosa"
Para o parlamentar social-democrata Ralf Stegner, especialista em política externa, Merz sugere que os ataques realizados pelo primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, seriam "presumivelmente contrários ao direito internacional" ao chamá-los de "trabalho sujo".
"Para um representante da Alemanha, qualquer demonstração pública de alívio é totalmente inadequada. Isso vale ainda mais quando se leva em conta os inegáveis riscos significativos de escalada", disse Stegner nesta quarta-feira (18/06) à revista alemã Der Spiegel.
Já Siemtje Möller, vice-líder da bancada do SPD no Bundestag (câmara baixa do parlamento alemão), disse ao portal de notícias t-online que esse tipo de retórica é preocupante num momento em que "todos os líderes políticos precisam de tato diplomático na comunicação pública", dada a situação "altamente sensível e extremamente perigosa" no Oriente Médio.
Merz "abandona o direito internacional"
As reações vieram também de outros espectros políticos. Sören Pellmann, líder do partido A Esquerda no Bundestag, acusou o chanceler de "jogar o direito internacional pela janela".
"O fato de o chanceler Merz agora estar abandonando o direito internacional e adotando a lógica desastrosa da 'lei do mais forte' é um escândalo e prejudica enormemente a reputação da Alemanha nas Nações Unidas e além", disse Pellmann à agência de notícias dpa.
O copresidente do partido A Esquerda e membro da Comissão de Relações Exteriores do Bundestag, Jan van Aken, acusou o chanceler de zombar das vítimas civis do conflito. "Merz deveria limpar um banheiro. Assim, ele saberia o que significa trabalho sujo", afirmou ao jornal alemão Sueddeutsche Zeitung.
Já Anton Hofreiter, deputado do partido Verde, que faz oposição ao governo, disse à emissora Welt TV que a escolha de palavras de Merz foi "desajeitada", já que "civis também estão morrendo nos ataques de Israel ao Irã".
A chefe do partido populista de esquerda BSW, Sahra Wagenknecht, apontou que o líder alemão rompe com a tradição alemã de "contenção e moderação na política externa" e que sua fala é um "descarrilamento sem precedentes" diante de um conflito que faz vítimas civis.
"Nem uma palavra sobre desescalada. Mesmo a entrada dos EUA na guerra aparentemente não seria um problema para Merz. O fato de uma conflagração estar agora ameaçando o Oriente Médio não vale uma única palavra para o chanceler", disse Wagenknecht em publicação no X.
Alemanha enfatiza risco do programa nuclear iraniano
Um porta-voz do governo respondeu às críticas, reforçando que Merz apenas enfatizou o risco que o programa nuclear iraniano representa a Israel e ao mundo.
A Alemanha defende o direito de Israel se defender, e endossa a posição de que uma bomba nuclear nas mãos do Irã colocaria em risco a existência de Israel.
Em nota conjunta, a cúpula do G7 também reforçou apoio à ação israelense ao acusar o Irã de ser "fonte de instabilidade e terror" no Oriente Médio.
gq/ra (dpa, ots)