"Temos de falar sobre a reforma do Conselho Constitucional"
24 de junho de 2025O juiz do Conselho Constitucional Albano Macie afirmou, na segunda-feira (23.06), que o que aconteceu em Moçambique depois das eleições gerais de outubro não foram manifestações, mas sim uma "insurreição fracassada", que só não foi avante porque o grupo que organizou os protestos não teve o apoio das Forças Armadas.
Em entrevista à DW, Wilker Dias, diretor da Plataforma Decide, organização não-governamental que acompanha os processos eleitorais em Moçambique, diz que as declarações só provam as "inclinações partidárias" de alguns tribunais. O que devia estar a ser discutido neste momento, sublinha, seria a reforma do Conselho Constitucional.
DW África: Como avalia os pronunciamentos do juiz do Conselho Constitucional Albano Macie sobre a suposta "insurreição fracassada"?
Wilker Dias (WD): Estes pronunciamentos revelam um pouco aquilo que já vinha sendo matéria de debate nos últimos tempos, de que alguns tribunais se encontram, infelizmente, capturados por inclinações partidárias. Quem é moçambicano conhece, de forma direta, a realidade que o país vivenciou.
Se analisarmos bem, as últimas eleições foram de fraudes, tal como as eleições anteriores. É um ciclo repetitivo que acaba trazendo as suas consequências. Houve uma miscelânea de razões para os protestos – além da insatisfação com os resultados, também houve fatores sociais que os motivaram. Portanto, afirmar que as últimas manifestações não tiveram um cunho eleitoral é revelar que não se domina a realidade do país.
DW África: Sendo assim, devia estar a ser discutida uma verdadeira reforma do Constitucional, relembrando que as manifestações se intensificaram, sobretudo, depois de o Conselho Constitucional ter validado os resultados das eleições de 9 de outubro?
WD: A reforma do Conselho Constitucional é uma das grandes prioridades. O Conselho Constitucional não é imparcial, não consegue fazer dignamente o trabalho para que foi criado, em termos constitucionais. Não consegue fazer isso. Estes pronunciamentos do juiz conselheiro demonstram, de forma evidente, que é necessária uma reforma.
DW África: Falemos também da Comissão para o Diálogo de Paz e Reformas em Moçambique, que terá três membros da sociedade civil. Como será o contributo da sociedade civil para este processo?
WD: Acredito que a intervenção da sociedade civil poderá ser importante, mas há algo que falta para nós sabermos se os resultados serão mesmo aqueles que pretendemos. Porque quando se dá primazia à Comissão [Técnica] ou aos partidos políticos para escolherem, entre os candidatos existentes, quem serão os três [membros da sociedade civil], isso acaba suscitando diversas dúvidas sobre transparência. Porque é que não deixaram a sociedade civil, por si só, indicar de forma direta os seus elementos para os três lugares?
Além disso, três lugares não é o suficiente, porque nós temos organizações [não-governamentais], religiosos, académicos e outras personalidades de diversas áreas. Será complicado representar a sociedade civil com apenas três lugares.