Tarifas de Trump levam China e UE a diversificar comércio
14 de abril de 2025"Reduzir o risco, diversificar e reequilibrar o comércio": o mantra outrora utilizado para os países se tornarem menos dependentes da China como parceiro comercial está agora a ser aplicado aos Estados Unidos. As tarifas do Presidente Donald Trump, que atualmente totalizam 145% sobre os produtos fabricados na China, provocaram ondas de choque nos mercados financeiros, de Sydney a São Paulo.
A Capital Economics alertou, na passada quinta-feira (10.04), que se as tarifas não forem reduzidas, as exportações da China para os EUA cairão para mais de metade nos próximos anos, reduzindo o crescimento económico chinês até 1,5%. Muitos produtos chineses são fabricados especificamente para o mercado americano, pelo que os economistas receiam que a China tenha dificuldade em redirecionar esses produtos para os consumidores nacionais.
Para além de aumentar os direitos aduaneiros sobre os EUA para 125%, Pequim está agora a repensar a sua estratégia de exportação, dando prioridade a outros parceiros comerciais globais para ajudar a atenuar o golpe na diminuição das exportações para a maior economia do mundo.
O Presidente chinês, Xi Jinping, comprometeu-se a aprofundar a "cooperação global" com os países vizinhos da China e, na sexta-feira (11.04), instou a União Europeia a juntar-se a Pequim para resistir à "intimidação unilateral" de Washington.
Diana Choyleva, fundadora e economista-chefe da Enodo Economics, uma empresa de investigação londrina centrada na China, considera que Pequim irá procurar aumentar as exportações com os seus vizinhos regionais, apesar das relações tensas com alguns.
China restabelece laços com antigos inimigos
"O recente relançamento dos diálogos económicos de Pequim com o Japão - os primeiros em seis anos - e a Coreia do Sul sugere que as potências regionais estão a reavaliar as relações em resposta à incerteza americana", disse Choyleva à DW. "Embora Seul tenha negado as alegações da mídia estatal chinesa de uma 'resposta conjunta' às tarifas, a mera renovação da cooperação económica trilateral após anos de relações tensas sinaliza um gesto estratégico", acrescenta.
Os meios de comunicação social chineses noticiaram que Xi Jinping iria embarcar numa viagem a três países do Sudeste Asiático esta semana para consolidar os laços comerciais com o Vietname, a Malásia e o Camboja.
Nas últimas duas décadas, a China e o Sudeste Asiático aprofundaram significativamente os seus laços comerciais. Em 2023, o volume total de comércio entre a China e os países da ASEAN atingiu aproximadamente 872 mil milhões de dólares (794 mil milhões de euros), de acordo com dados do governo chinês. Este valor deverá aumentar ainda mais agora que as empresas chinesas estão excluídas do mercado dos EUA.
"Os fabricantes chineses vão procurar bolsas de oportunidades no Sudeste Asiático onde, no passado, não tinham investido tempo, esforço e dinheiro em investigação, porque tinham um mercado americano lucrativo que absorvia tudo o que produziam", disse à DW Deborah Elms, diretora de política comercial da Fundação Hinrich, com sede em Singapura.
Europa também tem de diversificar o comércio
Apesar de ter sido suspensa por 90 dias, a UE enfrenta uma nova tarifa de 20% sobre um montante máximo de 380 mil milhões de euros (416 mil milhões de dólares) de exportações para os EUA. Os responsáveis políticos em Bruxelas estão a ponderar uma resposta semelhante à da China. A UE afirma que tenciona contactar os países do Indo-Pacífico e do Sul Global numa tentativa de contrariar o protecionismo dos EUA.
Durante uma visita de três dias ao Vietname, na semana passada, o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sanchez, insistiu para que a Europa explore novos mercados e disse que o seu governo estava "firmemente empenhado" em abrir o país e a Europa a mais comércio com o Sudeste Asiático.
Mas Varg Folkman, analista político do Centro de Política Europeia (EPC), adverte que a Europa terá dificuldade em substituir as exportações através do Atlântico por outros mercados, uma vez que a economia dos EUA é "maior e mais rica".
Folkman observa uma "grande resistência" entre os membros da UE a novos acordos comerciais, destacando a relutância da França em abrir o seu setor agrícola ao Brasil e à Argentina durante o acordo comercial da UE com o Mercosul, o bloco regional sul-americano. O acordo levou 25 anos a ser negociado e ainda não foi ratificado.
"Os acordos comerciais são controversos", afirmou o analista à DW. "Será potencialmente muito difícil implementar novos acordos, mesmo com a urgência que vemos hoje."
Embora a UE e a China possam tentar impulsionar o comércio bilateral, os economistas e os decisores políticos receiam também que a Europa possa ter dificuldades em lidar com as tarifas muito mais elevadas dos EUA e uma nova rivalidade comercial com a China, a segunda maior economia do mundo.
Excesso de oferta chinesa ameaça rivais europeus
Num comentário publicado na passada terça-feira, o Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS), um grupo de reflexão com sede em Washington, escreveu que as tarifas dos EUA "podem acabar por gerar um desvio dos produtos de exportação chineses para a União Europeia, o que colocará pressões adicionais sobre os produtores europeus e provavelmente suscitará apelos a uma resposta protecionista de Bruxelas."
Há muito que a UE manifesta preocupação com os grandes subsídios estatais concedidos aos produtores chineses, que lhes permitem "despejar" produtos baratos nos mercados europeus. Estes subsídios, juntamente com os custos de mão de obra barata e as enormes economias de escala, exerceram pressão sobre os concorrentes europeus, levando a falências e a cortes significativos de postos de trabalho.
Os veículos elétricos são o exemplo mais recente. Graças às subvenções governamentais, aos benefícios fiscais e aos empréstimos, as marcas chinesas de veículos elétricos, como a BYD, a Nio e a XPeng, estão agora a entrar agressivamente no mercado da UE.
A indústria automóvel europeia está atualmente a passar por uma grande reestruturação, ameaçando encerrar fábricas, reduzir o tamanho de outras e arriscando-se a perder dezenas de milhares de postos de trabalho, especialmente na Alemanha.
Enquanto Washington impôs uma tarifa de 100% sobre os veículos elétricos fabricados na China, bloqueando efetivamente os fabricantes de automóveis chineses no mercado dos EUA, a tarifa da UE difere consoante o fabricante de automóveis chinês. O máximo é de 35,3% e apenas 17% são aplicados à BYD.
Elms, da Fundação Hinrich, considera que poderá haver uma "explosão inicial" de produtos a baixo preço da Ásia para o resto do mundo. "Mas não vão continuar a produzir bens que não dão lucro, pelo que as empresas chinesas vão passar rapidamente a fabricar outros produtos. Caso contrário, ficarão fora do mercado", afirmou.
Novo sistema de alerta precoce
Jörg Wuttke, antigo diretor do gigante industrial alemão BASF na China, alertou para um "tsunami de excesso de capacidade" chinês que se dirige para a Europa. O eurodeputado alemão apelou a uma melhor "comunicação e confiança" entre Bruxelas e Pequim para evitar novas práticas de "dumping".
Volkman, especialista em política industrial europeia, duvida que a UE aceite mais distorções comerciais sem resistência. "A Comissão Europeia sinalizou que vai manter uma vigilância apertada sobre as importações e tomar medidas se um aumento da China, ou de qualquer outro lugar, a obrigar a isso", disse à DW.
Em 2023, a UE anunciou planos para um grupo de vigilância de importações para monitorizar aumentos repentinos nas importações que poderiam ameaçar as indústrias europeias. O sistema de alerta precoce foi criado para ajudar o bloco a afastar-se da China.
No entanto, há receios de que outros exportadores asiáticos e os EUA possam também descarregar na UE mercadorias excedentárias a preços baixos. O grupo de trabalho poderia ajudar Bruxelas a responder muito mais rapidamente às ameaças de vários lados, com investigações anti-dumping, direitos aduaneiros e restrições temporárias às importações.
No entanto, Bruxelas enfrentaria críticas por refletir as políticas protecionistas de Trump, marcando um afastamento do apoio de longa data da UE ao comércio livre, corroendo ainda mais as normas da Organização Mundial do Comércio (OMC) e arriscando o agudizar das tensões comerciais globais.