Guerra comercial à vista? Europa desafia Trump
3 de abril de 2025A decisão do Presidente norte-americano, Donald Trump, de impor novas tarifas sobre as importações provenientes de dezenas de países está a provocar uma onda global de indignação, receios económicos e promessas de retaliação.
Numa decisão que remete aos tempos mais protecionistas da história económica dos Estados Unidos, o Presidente norte-americano, Donald Trump, anunciou esta semana um novo pacote de tarifas comerciais globais, com taxas mínimas de 10% aplicáveis a todos os países, escalando até 46% para nações consideradas "infratoras". O impacto foi imediato: bolsas em queda, alianças tensas e a perspetiva de uma guerra comercial generalizada.
Os países da União Europeia (UE) foram especialmente visados, com tarifas fixadas em 20% sobre todas as suas exportações para os EUA. Em resposta, a Comissão Europeia e os líderes dos Estados-membros reagiram com dureza, manifestando-se prontos a retaliar. A presidente Ursula von der Leyen classificou as medidas de Trump como "um rude golpe" para a economia mundial, sublinhando que a UE está "preparada para responder".
Reação firme da Comissão Europeia
Ursula von der Leyen acrescentou que o bloco está "pronto para responder" às tarifas norte-americanas. A dirigente anunciou que o primeiro pacote de contramedidas será aplicado já a partir de 14 de abril, incidindo sobre produtos como aço e alumínio. Um segundo pacote, que poderá incluir serviços digitais, estará pronto até ao final do mês.
O eurodeputado Bernd Lange confirmou que haverá tarifas retaliatórias sobre têxteis, bens agrícolas e industriais norte-americanos.
Além disso, a UE está a considerar aplicar a chamada "ferramenta anti-coerção”, que permite responder a práticas comerciais abusivas com restrições de mercado, nomeadamente ao setor tecnológico norte-americano.
António Costa, presidente do Conselho Europeu, expressou "apoio total” à Comissão e defendeu o avanço dos acordos comerciais com parceiros estratégicos como Mercosul, México e Índia, como forma de diversificar relações comerciais e reduzir a dependência dos EUA.
Alemanha lidera oposição
A Alemanha foi a primeira a lançar um sinal de alarme. O vice-chanceler e ainda ministro da Economia, Robert Habeck, comparou o impacto das tarifas com a invasão da Ucrânia pela Rússia. "Estamos perante um momento de disrupção comparável ao início da guerra. Precisamos de agir com a mesma união e determinação", afirmou. Habeck apelou a uma resposta coordenada com parceiros globais como Japão, Coreia do Sul e China.
O chanceler alemão, Olaf Scholz, considerou as tarifas "fundamentalmente erradas" e garantiu total apoio às iniciativas de Bruxelas. Por sua vez, Alice Weidel, líder do partido de extrema-direita AfD, chamou as tarifas de "veneno para o livre comércio", demonstrando uma rara convergência com o governo.
O setor automóvel alemão, um dos mais atingidos, já sentiu os primeiros efeitos: as ações da Volkswagen, BMW, Mercedes e Porsche caíram drasticamente após o anúncio de uma tarifa de 25% sobre veículos e peças. O mercado norte-americano é crucial para estas marcas.
França planeia retaliar nos serviços digitais
O Presidente francês, Emmanuel Macron, classificou as tarifas como "brutais e infundadas". A porta-voz do governo de Paris, Sophie Primas, afirmou que a UE está "pronta para uma guerra comercial” e confirmou que a resposta incluirá serviços digitais dos EUA, atualmente não taxados na Europa.
Macron suspendeu investimentos franceses nos EUA até que haja clareza nas negociações. A indústria do vinho e bebidas espirituosas deverá sofrer perdas estimadas em 1,6 mil milhões de euros por ano, segundo a FEVS, associação do setor.
Espanha lança plano de resposta
O primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, anunciou um robusto plano de resposta orçado em 14,1 mil milhões de euros para proteger os setores mais vulneráveis, como o agroalimentar e o automóvel. Classificando as medidas de Trump como "injustas e protecionistas", Sánchez apelou a uma resposta europeia proporcional e rápida.
O produto mais afetado será o azeite, cujas exportações ultrapassaram os mil milhões de euros em 2024. Também o setor do vinho e o das peças automóveis sentirão impactos diretos.
Unidade na tempestade
Todos os países da UE condenaram as tarifas. A Irlanda pediu uma resposta "proporcional", a Dinamarca defendeu ações "sólidas", e a Itália considerou a medida "errada”, mas reiterou abertura ao diálogo. A Finlândia e a Suécia lembraram que "não há vencedores numa guerra comercial", enquanto a Polónia e a Holanda enfatizaram a necessidade de preservar a coesão europeia.
A primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, classificou a medida como "errada”, mas manifestou vontade de negociar.
O Comité das Regiões da UE alertou para o impacto das tarifas nos setores agroalimentares e pediu medidas para proteger economias locais. As regiões da Normandia e Rioja foram particularmente vocais.
As bolsas mundiais reagiram negativamente. Wall Street perdeu entre 2,5% e 4,5%, e o valor das ações da Apple, Dell e Nike afundou com receios de subida de custos e retaliações. Na Europa, o DAX alemão e o CAC francês caíram cerca de 2,5%. O petróleo caiu mais de 4%, e o ouro disparou para máximos históricos.
"União Europeia está a afundar-se?
A Rússia comparou hoje a União Europeia (UE) a um navio que se "está a afundar", após a decisão dos Estados Unidos de impor tarifas.
"A União Europeia está a afundar-se. A sua economia, a sua política, a sua indústria, a sua produção, as suas finanças... tudo está a ir por água abaixo, isso é óbvio", disse Maria Zakharova, porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na sua conferência de imprensa semanal.
Segundo Zakharova, as notícias de Washington de quinta-feira à noite são "informações adicionais" que confirmam o fracasso de Bruxelas em cumprir os seus objetivos de crescimento económico anteriormente declarados.
Entretanto, o antigo Presidente russo Dmitry Medvedev, conhecido pelas suas declarações inflamadas nas redes sociais, escreveu hoje que o que Moscovo precisa de fazer é "sentar-se na margem e esperar que o cadáver do inimigo passe a flutuar".
"O cadáver em decomposição da economia europeia", especificou no Telegram.
"EUA sairão mais fortes”
Na quarta-feira, Donald Trump anunciou uma tarifa mínima de 10% sobre todas as importações dos EUA, aumentando essa percentagem em função do que classificou como "barreiras injustas” impostas por outros países. Para a União Europeia, Trump definiu uma tarifa de 20%, argumentando que os produtos norte-americanos enfrentam 39% de obstáculos tarifários e não tarifários para entrar no mercado europeu.
"A operação foi concluída! O paciente sobreviveu e está a recuperar. O prognóstico é que o paciente estará muito mais forte, maior, melhor e mais resiliente do que nunca", escreveu Trump na rede Truth Social.