RDC: Congoleses relatam medo na cidade dominada pelo M23
3 de fevereiro de 2025Os moradores de Goma, no leste da República Democrática do Congo (RDC), viram-se no meio do fogo cruzado entre os rebeldes do M23 e o Exército congolês, que lutava para manter o controlo da cidade.
A capital da província de Kivu do Norte foi, entretanto, ocupada pelo grupo rebelde, que está a ganhar terreno na região.
Ghislaine Kasenge é uma das muitas pessoas apanhadas de surpresa pelos combates da semana passada em Goma. Ela diz ter sido baleada por um soldado que tentou extorquir o seu marido. Segundo conta, o soldado abriu fogo e uma das balas passou de raspão nas suas costelas.
"Ele queria esconder-se na nossa casa. Dissemos-lhe que, como civis, não devíamos participar no conflito. Ele pareceu compreender, mas pediu-nos 100 dólares para nos deixar em paz. Dissemos-lhe que não tínhamos esse dinheiro e ele pediu-nos 100.000 francos congoleses", conta a residente de Goma.
Traumas da guerra
O conflito marcou esta família. Ghislaine Kasenga sofre de hipertensão e o seu marido, Jean Kasereka, está desempregado.
"A minha mulher, apesar do seu estado de saúde, vai ter com os vizinhos e com alguns conhecidos para nos arranjar algo para comer", diz Kaserela, reconhecendo o esforço da esposa para manter a família.
Atualmente, qualquer barulho assusta a filha mais nova do casal, Eva. As detonações durante os confrontos entre o Exército e os rebeldes provocaram-lhe ansiedade.
De acordo com Jean Kasereka, a pequena Eva "tem estado perturbada". "Receamos um distúrbio cerebral, mas ela tem febres e pensamos que é tudo devido ao medo", lamenta o pai.
Retorno à normalidade?
A vida em Goma está a regressar gradualmente à normalidade. Há alguns transportes públicos e os mercados estão a reabrir, segundo verificou a DW no local.
Mas os comerciantes e os residentes na estrada para Minova estão cautelosos, porque a cidade estratégica na margem do Lago Kivu também está sob controlo dos rebeldes.
Milhares de deslocados no leste congolês receiam novos ataques e violência sexual se regressarem a casa após os recentes combates, apesar dos rebeldes que ocuparam a região os encorajarem a voltar.
"A minha preocupação é a paz"
Desde que os rebeldes do M23, alegadamente apoiados pelo Ruanda, tomaram Goma, na semana passada, avançaram, entretanto, para Bukavu, no Kivu do Sul, agravando uma crise humanitária sem precedentes.
Floride Furaha, deslocada várias vezes, relatou à agência de notícias Reuters a violência sexual generalizada exercida por grupos armados contra mulheres e raparigas: "Eles entram nas casas e violam mães e filhas. Se as encontram juntas em casa, violam-nas todas juntas na sua tenda".
"A minha preocupação é a paz. Porque se regressarmos a Nzulo, aqueles que nos tomaram a terra ainda lá estão e continuam a matar pessoas e a espalhar o terror", afirma Floride Furaha, acrescentando que só regressará "quando houver paz e tranquilidade".
Na semana passada, o Ministério da Saúde da RDC declarou que mais de 700 corpos se encontravam nas morgues dos hospitais nos arredores de Goma, tendo sido registados quase 3.000 feridos.
Críticas internacionais
As críticas internacionais ao alegado apoio do Ruanda ao M23 têm aumentado, com apelos crescentes a um cessar-fogo.
Após um encontro de líderes da SADC, na sexta-feira passada, o Presidente do Burundi, Évariste Ndayishimiye, afirmou que "há risco de a guerra se alastrar pela região".
Segundo Ndayishimiye, "se o Ruanda continuar a avançar no território de outro país, sei que isso vai acontecer até no Burundi, porque o Ruanda está a apoiar jovens refugiados. Está a treiná-los para a guerra do Congo. Não vamos aceitar a guerra, ela vai ser regionalizada".
Apesar das críticas internacionais, o Ruanda nega qualquer envolvimento com o M23.