"Queriam silenciar-me": Músico recorda trauma de sequestro
10 de agosto de 2025Benedito Manuel, artisticamente conhecido por "Benny Clor", foi sequestrado a 21 de julho, no distrito de Monapo, quando viajava para Nacala, onde trabalhava. Foi libertado na noite de 23 de julho, no distrito de Ribáuè, por homens armados até aqui desconhecidos.
Tudo começou depois de o jovem, de 31 anos, ter solicitado uma boleia a um novo amigo, que acabava de conhecer e sem tanta afinidade. A viagem que seria de Nampula para Nacala terminou num outro destino, contra a sua vontade.
"Em Namialo [no prosseguimento da viagem] ficámos parados por mais de uma hora, porque o motorista – o suposto amigo meu – tinha saído. Ficámos à espera dele, éramos no total cinco pessoas. Uma hora depois o motorista voltou com uma cerveja e refrigerante, para mim, e continuamos a viagem. Na zona de Nacololo [Monapo], eu simplesmente 'desliguei', não sei se foi sono. Desde ali não me lembro mais nada que me tenha acontecido", começa por relatar.
"Benny Clor" conta que despertou num cativeiro onde passou aproximadamente dois dias sem comer e beber. Rodeavam-no pessoas armadas e encapuzadas e apenas ouvia vozes. O jovem afirma que foi torturado física e psicologicamente.
"Os homens tiraram-me a máscara, a camisola, o chapéu, as calças e deixaram-me totalmente nu. Pegaram no telemóvel e tiraram-me fotos, filmaram-me e disseram-me 'jovem, hoje podes ter sorte, mas não vais ter da próxima vez, és muito criança para falar de assuntos que não têm nada a ver contigo. Para de falar de assuntos de gente grande'", lembra.
"O objetivo é manterem-me silenciado"
O rapper acredita que o sequestro era uma forma de o silenciar. "O objetivo deles é manterem-me silenciado e assustado, para que eu pare de fazer as intervenções que tenho feito."
"Benny Clor" aborda nas suas músicas temas sensíveis, que costumam encher de nervos a elite política, próxima ao partido que governa Moçambique desde a independência, há 50 anos. Escreveu músicas intituladas "Stop eleições presidenciais 2024", "Vão te mentir de novo", "Vocês sabiam" e "A realidade do país".
"Eles disseram-me para apagar todas as minhas publicações e músicas nas redes sociais, principalmente todas as músicas que interferem com o Governo. As minhas músicas interferem a 100% com o Governo, são muito fortes. Eu canto o quotidiano do povo moçambicano", sublinha o músico.
O jovem diz ter denunciado o caso às autoridades. O porta-voz do Comando Provincial de Nampula, Dércio Samuel, disse, sem gravar entrevista, que a polícia tem conhecimento e está a investigar o assunto.
Jovem fica desempregado
Benedito Manuel revela, entretanto, que perdeu o emprego. Diz ter explicado tudo sobre o sequestro ao seu patrão e que foi despedido.
"O patronato disse que não tinha de continuar, porque eu estava a manchar o nome da empresa e que sou revolucionário e faço músicas que falam do Governo. Estou neste momento desempregado, com a família para cuidar, mas por causa deste país eu não me arrependo. O mais irónico é que o patrão disse para mim que 'ouviu que sou apoiante do Venâncio Mondlane e faço música de intervenção social'", conta.
Segundo Manuel, o antigo patrão pediu ainda que fosse "ao partido FRELIMO pedir cartão de membro, tirar foto e partilhar nas redes sociais".
O jovem rapper não esconde a admiração que tem pelo ex-candidato presidencial Venâncio Mondlane, mas sublinha que nunca pertenceu ao seu movimento.
"Eu não sou apoiante do Venâncio, eu sou apoiante das ideias do Venâncio", esclareceu.
O subgerente da empresa onde trabalhava o cantor desmente o músico. Contactado pela DW, aceitou prestar declarações sob condição de anonimato.
"Da minha boca, não saiu o que ele está a dizer. Ele abandonou o trabalho e não justificou a sua ausência, o que ele está a dizer é pura mentira. Eu não sei de que partido ele é. Como o poderia obrigar a tirar cartão de membro se eu próprio não tenho cartão de membro?", questiona o subgerente.
Sem trabalho, o jovem encontra-se agora num limbo e aguarda esclarecimentos sobre quem o sequestrou.