Processo contra Lissu: Ameaça à democracia na Tanzânia?
8 de maio de 2025Tundu Lissu, líder do Chadema, foi detido no mês passado e acusado de traição por um alegado discurso em que apelava aos tanzanianos para se revoltarem e perturbarem as eleições presidenciais e legislativas previstas para outubro.
O principal partido da oposição da Tanzânia foi também desqualificado das eleições depois de recusar assinar um "código de conduta" eleitoral.
Lissu enfrenta uma potencial sentença de morte se for condenado por traição - a ameaça mais grave até à data, apesar das múltiplas detenções ao longo dos anos.
O crime de traição tem-se tornado cada vez mais politizado na nação da África Oriental, observa Fulgence Massawe, um perito jurídico baseado na capital comercial do país, Dar es Salaam, que disse que é "muito grave para a Tanzânia como parte da Commonwealth".
"É por isso que estes crimes visam frequentemente políticos e declarações políticas feitas por figuras da oposição", acrescentou Masawe.
Apesar da gravidade do caso, Lissu deixou claro que está pronto a lutar contra as acusações de que é alvo, mas apenas em tribunal. Recusou-se a participar na audiência de 24 de abril, quando as autoridades disseram que esta seria realizada por videoconferência a partir do estabelecimento prisional.
"O nosso cliente tem o direito de ser levado a tribunal", disse aos jornalistas na semana passada o líder da equipa jurídica de Lissu, Rugemeleza Nshala, acrescentando que as regras do processo penal são as seguintes: sempre que se é convocado, tem de se comparecer fisicamente no tribunal.
"Num processo penal, não se pode ser julgado em casa ou noutro lugar", disse Nshala, acrescentando que Tundu Lissu, "uma vez que conhece a lei, recusou-se a participar".
Luta pela reforma eleitoral na Tanzânia
Lissu foi detido no sul da Tanzânia, onde estava a realizar comícios públicos para promover a campanha do seu partido "Sem Reformas, Sem Eleições", que apela a alterações profundas no sistema eleitoral do país, que, segundo ele, favorece o partido no poder.
O governo alega que incitar os cidadãos a boicotar as eleições constituiu um ato de rebelião.
John Heche, vice-presidente do Chadema, que também foi detido várias vezes, mas sem qualquer acusação, insiste que defender uma causa justa é o que o fundador da nação encorajou os jovens a fazer. "Mwalimu Nyerere disse que os jovens tanzanianos deviam revoltar-se contra o sistema opressivo", afirmou Heche. "Qual é o problema de nos rebelarmos contra quem rouba eleições, contra eleições que estão a ser manipuladas?"
Jenerali Ulimwengu, advogado e jornalista veterano, fez eco dos sentimentos de Heche. "Após um longo período de tentativas de construção da democracia, a Tanzânia - outrora conhecida por manter a paz no meio do caos dos seus vizinhos - está agora a tomar medidas para inverter os poucos progressos alcançados", disse à DW.
Ulimwengu sugeriu que o governo optou por não "realizar eleições genuínas, mas sim por encenar um espetáculo e anunciar percentagens de vitória inflacionadas". De acordo com advogado e jornalista, não houve "eleições verdadeiras" na Tanzânia em 2019 e 2020, incluindo as eleições autárquicas do ano anterior.
Instituições condenam detenção de Lissu
A União Democrática Internacional (UDI), que defende a liberdade política, a liberdade individual, a igualdade de oportunidades e o desenvolvimento económico, emitiu uma declaração no final de abril manifestando a sua "profunda preocupação com a detenção e a escalada da perseguição política" de Lissu, "na sequência da sua detenção (...) no âmbito de uma manifestação política pacífica realizada em Mbinga".
A UDI afirmou que "exigir uma reforma eleitoral e eleições livres não é traição, é a própria essência da democracia" e apelou à libertação imediata e incondicional de Lissu e à restauração dos plenos direitos de participação política de Chadema.
Também a Comissão Internacional de Juristas (CIJ) fez uma declaração semelhante, apelando ao governo da Tanzânia para que deixe de comprometer o Estado de direito e respeite os direitos dos partidos políticos de se organizarem e promoverem as suas causas, bem como os direitos dos cidadãos tanzanianos à liberdade de associação e de reunião pacífica, tal como consagrado no direito nacional, regional e internacional."
O Tribunal Internacional de Justiça (TIJ) apelou à primeira mulher Presidente da Tanzânia, Samia Suluhu Hassan, para que "demonstre liderança e renove os compromissos que assumiu aquando da sua tomada de posse, a fim de conduzir o país de volta ao progresso democrático".
Os ativistas dos direitos humanos acusaram o governo de Samia Suluhu Hassan de recorrer a táticas repressivas contra a oposição. A Amnistia Internacional denunciou aquilo que classificou como uma "campanha de repressão" por parte do executivo, numa declaração em que criticava a detenção de Lissu e o uso de "medidas intimidatórias para silenciar os críticos". O governo rejeita as acusações.
Na terça-feira (06.05), o Tribunal de Kisutu ordenou às autoridades prisionais que apresentassem Tundu Lissu pessoalmente para uma audiência agendada para 19 de maio.