O custo oculto da paz no norte da Nigéria
9 de agosto de 2025Ao longo da linha que separa os estados de Sokoto e Zamfara, perto da fronteira entre a Nigéria e o Níger, as aldeias de Sabon Birni e Isa foram abandonadas. Para evitar o mesmo destino, outras aldeias tentaram estabelecer acordos de paz com grupos locais de bandidos. Isto acontece após anos de tentativas falhadas do Estado nigeriano para erradicar atores armados não estatais que têm vindo a aterrorizar comunidades rurais nos estados do norte da Nigéria — Zamfara, Sokoto e Katsina.
Numerosos aldeões que falaram à DW relataram casos de familiares raptados e mortos. Os seus meios de subsistência — baseados sobretudo no cultivo de sorgo, milho-painço e criação de gado, e na venda destes produtos em mercados locais — foram gravemente afetados. As famílias enfrentam agora uma crescente escassez de alimentos devido ao abandono das terras agrícolas ou ao saque das colheitas. A situação é tão grave que toda a região norte da Nigéria — historicamente o coração agrícola do país — já não consegue produzir comida suficiente.
"Temos implorado por paz. Queremos viver e cultivar em paz. Não temos acesso às nossas terras. Temos de pedir ajuda para alimentar as nossas famílias", disse Suraju Mohammed, de Sokoto, à DW, acrescentando que nada é mais importante do que a paz.
Sem escolha
O analista de resolução de conflitos Dengiyefa Angalapu, do Centre for Democracy and Development, sediado em Lagos, descreve as difíceis decisões dos aldeões como "o fracasso do contrato social entre o Governo nigeriano e o povo nigeriano”. Procurar um acordo de paz com atores armados não estatais violentos torna-se, segundo disse à DW, "um cálculo racional de sobrevivência”.
"As comunidades conhecem estes atores. Dir-lhe-ão: ‘Conheço o pai dele, conheço a mãe. Esta pessoa cresceu connosco'”, referiu Angalapu.
Os agricultores que pretendem regressar aos campos para produzir alimentos para as suas famílias arriscam-se a ser raptados ou a ter de pagar impostos impostos pelos grupos armados. Os territórios controlados por bandidos sobrepõem-se, pelo que, mesmo que se alcance um acordo com um grupo em troca de taxas de proteção, combustível ou partilha de alimentos, outro grupo pode não respeitar o pacto.
Recentemente, bandidos armados em motorizadas invadiram Sabongarin Damri, no estado de Zamfara, matando 11 pessoas e raptando pelo menos 70, incluindo mulheres e crianças.
"Queremos o fim do derramamento de sangue. Por isso, apoiamos o acordo”, disse Suraju Mohammed à DW. "Queremos que as mortes parem e viver em paz.”
Apelos para reforçar a capacidade do Estado
Analistas e observadores internacionais afirmam que existem atualmente áreas da Nigéria que já não estão sob controlo governamental. Isto tem implicações graves para a segurança nacional.
"Há agora algum nível de governação paralela”, disse Angalapu à DW. Negociações com gangues violentos dão-lhes uma certa legitimidade aos olhos das comunidades, o que dificulta travar o seu recrutamento.
"Eles dizem às comunidades: ‘Estamos a lutar por vocês. Este Governo não vos pode proteger' — e, a longo prazo, isso é muito prejudicial para a segurança nacional.”
Mas, a nível local, Angalapu sublinha que as comunidades têm pouca escolha.
"Não é que queiram estes acordos de paz. É um ato de sobrevivência. Temos de reforçar a capacidade do Estado para proteger estas comunidades”, afirmou.
Para alguns habitantes, como Aisha Tukur, do estado de Zamfara, fazer as pazes com os bandidos é impensável: "Mataram oito pessoas em Turmi, quatro em Damne, três em Dauku. Como podemos fazer as pazes com isso? Não haverá reconciliação. Devem ser julgados. São cruéis. Não ouvem os nossos apelos.”
Combate aos bandidos e insurgentes
Os governos estaduais locais têm combatido atores armados não estatais violentos há anos. Mas, até agora, nem as tentativas de mediação, nem as campanhas de desradicalização, nem as operações militares com patrulhas armadas e ataques aéreos conseguiram trazer estabilidade duradoura.
Umaimah Abubakar fugiu da aldeia agrícola de Ranganda, a cerca de 50 quilómetros a norte da cidade de Sokoto, e vive agora num campo para deslocados internos. "O Governo não fez praticamente nada por nós, exceto pagar resgates quando os bandidos os exigiam. Mesmo assim, meses depois, eles voltavam”, contou à DW.
As gangues de bandidos mantêm acampamentos numa vasta área florestal que atravessa os estados de Zamfara, Katsina, Kaduna e Níger. Pensa-se que a violência começou com confrontos entre pastores e agricultores por terra e recursos, mas acabou por evoluir para um conflito mais amplo, alimentado pelo tráfico de armas facilitado pela instabilidade na região do Sahel.
Para piorar, a violência está a espalhar-se para além do noroeste, e as gangues estão cada vez mais bem armadas e coordenadas. A crescente cooperação entre estas redes criminosas — movidas principalmente por dinheiro — e jihadistas que travam uma insurreição armada há 16 anos no nordeste agravou os ataques. Observadores ocidentais indicam que, entre 2018 e 2023, os bandidos mataram mais civis do que os jihadistas.