Mundo "ignorou avisos" sobre liberdade de imprensa em Bissau
18 de agosto de 2025Os jornalistas guineenses estão incrédulos após, na semana passada, o Governo da Guiné-Bissau ter decidido expulsar do país jornalistas da RTP, RDP e da Agência Lusa.
O Sindicato dos Jornalistas e Técnicos da Comunicação Social (Sinjotecs) condena a decisão das autoridades nacionais.
"Não podemos ter outra posição senão condenar este facto com toda a veemência", afirma Indira Baldé, jornalista da RTP e presidente do Sinjotecs, em entrevista à DW África.
A líder sindical sublinha que não faltaram alertas sobre as ameaças à jornalistas da RTP, RDP e da Agência Lusa. na Guiné-Bissau - avisos que, segundo Indira Baldé, foram ignorados pela comunidade internacional.
DW África: A expulsão da RTP e Lusa já era previsível, considerando o histórico de ameaças a jornalistas da Guiné-Bissau?
Indira Baldé (IB): Para mim, enquanto jornalista e líder sindical, esta decisão não foi surpreendente. Os factos já registados demonstravam que, mais cedo ou mais tarde, chegaríamos a este ponto. Os jornalistas têm sido sistematicamente atingidos durante reportagens de diversas situações. Vimos colegas sendo insultados publicamente, impedidos de exercer o seu trabalho. Tudo começou com a colega Fátima Tchumá Camará, que foi impedida de entrar na Presidência para realizar uma reportagem. Depois, recebi recados, fui expulsa de uma reportagem de atos do Governo. São factos concretos. Vimos [depois] as emissões da RTP e da RDP África serem suspensas na Guiné-Bissau.
Todos esses acontecimentos, registados ao longo do tempo, foram sinais claros de que, um dia, chegaríamos a este ponto. Para mim, não é surpresa.
DW África: Mas também não lhe surpreende o facto de, perante todas essas situações, incluindo a suspensão das emissões da RTP e da RDP, imperar o silêncio por parte das autoridades portuguesas?
IB: Da última vez, fomos informados de que o caso estava a ser tratado a nível diplomático entre os dois Estados. Entretanto, surgiu mais um episódio, que também está a ser tratado diplomaticamente entre Portugal e Guiné-Bissau. Estamos, portanto, a aguardar o que poderá resultar dessas negociações ou encontros entre os governos dos dois países.
DW África: Enquanto líder sindical, como reage a essa situação, especialmente ao risco de funcionários desses órgãos ficarem desempregados?
IB: A reação do sindicato é de condenação. Não podemos ter outra posição senão condenar este facto com toda a veemência.
O que vemos agora é que nem o Estado da Guiné-Bissau reconhece o risco que está a impor aos guineenses, pois na RTP África trabalham jornalistas e técnicos guineenses, não estrangeiros. A Agência Lusa também tem guineenses a trabalhar, assim como a RDP. Acreditamos que tanto a RTP, como a RDP e a Lusa estão a tratar da situação e que os postos de trabalho serão preservados.
DW África: Diante desta situação, podemos afirmar que está cada vez mais difícil falar de liberdade de imprensa e de expressão na Guiné-Bissau?
IB: Ao longo do tempo, temos feito denúncias sobre várias situações, mas não fomos ouvidos. Alertámos a sociedade guineense e a comunidade internacional sobre as ameaças à liberdade de imprensa.
Fizemos denúncias, pedimos a intervenção de várias entidades, inclusive do Presidente português, [Marcelo Rebelo de Sousa], na altura em que o Presidente guineense,[Umaro Sissoco Embaló], acusou a imprensa de ser da oposição e de não dizer a verdade. Não houve resposta, e hoje estamos nesta situação. Isso mostra que as nossas denúncias não eram infundadas, não eram apenas por denunciar.
Havia, de facto, situações que deveriam ter sido acauteladas. Infelizmente.