Moçambique: "Homens de negócios" no Governo de Chapo
18 de fevereiro de 2025Tansporte e Logística, Recursos Minerais e Energia, Interior, Justiça e Agricultura: segundo o Centro de Integridade Pública (CIP) de Moçambique, os ministros nomeados para estes setores no Governo de Daniel Chapo têm "interesses empresariais" nos mesmos.
Embora "não constitua irregularidade por si só", o CIP alerta para um "factor de risco", destacando "o poder de influenciar decisões nos setores que dirigem" e os "potenciais conflitos de interesses em processos de contratação pública".
Empresários na política
O CIP lembra que a entrada de empresários no mundo político "tem sido prática em Moçambique" e que nove dos 19 ministros que compõem o Governo formado em janeiro "têm interesses empresariais expostos em diversos setores". Destes, cinco têm empresas a operar nos setores que dirigem, segundo a organização.
"O titular de cargo público pode usar o seu poder para influenciar decisões políticas, leis, regulamentações e ainda manipular os processos de procurement público para beneficiar os seus negócios e a sua rede empresarial, colocando em causa questões ligadas à ética e à probidade pública, aspecto comum na política moçambicana", alerta o CIP, num documento divulgado esta terça-feira (18.02) e assinado por Milagrosa Calangue.
Sociedades e interesses arriscados
O relatório começa por destacar o ministro dos Recursos Minerais e Energia, Estevão Pale, que, segundo o CIP, "tem interesses em 18 empresas que operam em vários setores" - 11 das quais a operar no setor mineiro. O dirigente, a mulher e os filhos, lê-se no documento, participaram no registo destas empresas entre 1993 e 2022. A maioria foi constituída "no período em que Estevão Pale era Director Executivo da Companhia Moçambicana de Hidrocarbonetos" e uma das empresas terá recebido uma licença de propeção e pesquisa mineira "antes da sua existência legal". O CIP detalha a participação de Estevão Pale e família nestes empreendimentos, afirmando que tornam o ministro "susceptível a situações de conflitos de interesses".
Também o ministro dos Transportes e Logística terá interesses empresariais no setor que dirige, diz o CIP. João Matlombe criou uma empresa no setor dos transportes "cujo principal objeto social é trabalhar com o Governo e com os municípios no desenho e implementação de projectos de transporte e desenvolvimento urbano", explica a organização. O CIP considera que a relação entre o objeto social da empresa e o cargo que Matlombe ocupa atualmente "representa um risco para a prática de actos de corrupção, conflito de interesses e tráfico de influência em processos de contratação pública" de forma a "favorecer" a sua empresa.
O documento destaca ainda o ministro do Interior, Paulo Chachine, "sócio numa empresa para importação e exportação de artigos de armas de fogo", o ministro da Agricultura, "dono de duas empresas que operam no setor agrário" e o ministro da Justiça, "sócio numa empresa de consultoria jurídica".
"Risco para a transparência"
"Não há dúvidas de que os interesses empresariais dos governantes constituem factor de risco para a transparência no exercício da governação, principalmente para a área de contratação pública, através do lançamento de concursos públicos manipulados e sua adjudicação a empresas onde estes tenham, direta ou indiretamente, interesses", conclui o CIP.
A organização dá o exemplo do ministro dos Transportes e Comunicações e mais tarde das Obras Públicas do Governo de Filipe Nyusi, Carlos Mesquita, envolvido em vários casos de conflito de interesses, para concluir que no atual Executivo moçambicano "há ministros que reúnem condições para se verem envolvidos" em casos semelhantes.
O CIP considera "imprescindível que a Procuradoria-Geral da República e outras entidades responsáveis (...) reforcem os mecanismos de fiscalização dos processos de procurement público, concessão de licenças, entrega das declarações dos governantes, incluindo as actualizações feitas ao património, de modo a impedir o abuso do cargo para enriquecimento ilícito".
A organização diz ainda que a "Assembleia da República deve propor alterações na Lei de contratação pública de modo que seja mais abrangente sobre os beneficiários efetivos".