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ConflitosEtiópia

Medo da guerra em Tigray: Qual o papel da Eritreia?

14 de julho de 2025

A tensão está de volta em Tigray, Etiópia. A população está com medo, mas as partes outrora beligerantes garantem que não haverá guerra novamente. Contudo, as suas atitudes mostram outra coisa.

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Etiópia Hawzen 2021 | Combatente da TPLF em postos de guarda
Foto: Ben Curtis/AP/picture alliance

Os receios de guerra no Tigraytêm vindo a aumentar há meses - há relatos de movimentos de tropas e escaramuças com várias partes envolvidas.

"De momento, não estamos em condições de fazer nada. Nem pudemos fazer quaisquer planos. Porque se receia que amanhã possa haver uma guerra. A vida também se tornou muito cara", queixa-se um cidadão.

E o mesmo exige: "Tem de haver uma solução pacífica para que possamos continuar com o nosso trabalho e as nossas vidas".

As memórias ainda estão frescas da guerra de dois anos, que parecia ter terminado em novembro de 2022 com o acordo de cessar-fogo de Pretória. Dependendo das estimativas, entre 162 000 e 600 000 pessoas morreram na luta pelo poder extremamente brutal entre a Frente de Libertação do Povo Tigray (TPFL) e as forças vitoriosas do Governo central da Etiópia.

"Na altura, soldados do país vizinho do norte, a Eritreia, também lutaram ao lado do primeiro-ministro Abiy Ahmed. Já nessa altura, os analistas criticaram o facto de a Eritreia não ter estado à mesa das negociações em Pretória - porque o governante de longa data, Isaias Afewerki, também deveria ter sido envolvido para se conseguir uma paz duradoura", recorda outro cidadão. 

Etiópia Tigray Mekele 2025 | Deslocados internos do Campo de Sebacare
A guerra em Tigray causou milhares de deslocados, na imagem o Campo de Sebacare, Mekelle, que acolhe parte delesFoto: Alexander Mamo/AP/picture alliance

Rebeldes divididos

A situação política interna em Tigray preocupa: na sequência de lutas pelo poder, a TPLF está dividida - e a Eritreia poderia tirar partido dessa divisão.

Após a cisão, o antigo chefe das forças paramilitares de defesa de Tigray, que tinha sido derrotado na guerra, o general Tadesse Werede, tornou-se chefe do governo provisório em Mekelle.

Ele pediu cautela contra falsas análises - e prometeu: "Não haverá guerra ou provocação do lado de Tigray de forma alguma. Em geral, não temos a intenção ou o interesse de entrar em uma guerra".

Do outro lado da divisão dentro da TPLF está o presidente Debretsion Gebremichael. Esta fação é acusada de colaborar com a Eritreia, o que rejeita.

"Apelamos à comunidade internacional para que compreenda o nosso desejo de paz e desempenhe o seu papel, impedindo o Governo etíope e os seus aliados de se prepararem para a guerra", disse Debretsion Gebremichael.

População pede medidas às autoridades

Há um medo crescente entre a população civil de ser mais uma vez apanhada entre as linhas da frente.

"Tanto o governo interino como os membros da TPLF, que afirmam estar no comando, devem demitir-se ou usar o seu poder para acalmar as pessoas, trabalhando com o Governo federal para resolver todos os problemas e evitar o início da guerra", reivindica um cidadão. 

Gerrit Kurtz, especialista no Corno de África para o Instituto Alemão para os Assuntos Internacionais e de Segurança, em Berlim, considera que os conflitos por procuração são mais prováveis do que uma guerra formal entre Estados.

"A Etiópia fica enfraquecida quando está fragmentada e há conflitos internos por todo o lado, para os quais a Eritreia também contribui. É por isso que os vários conflitos políticos internos que estamos a viver há vários anos, alguns dos quais têm o apoio da Eritreia, são definitivamente do interesse da Eritreia", entende Kurtz.

Etiópia: Violações usadas como arma no conflito do Tigray

Segundo observadores, o Exército da Eritreia está a treinar grupos armados no país vizinho - por exemplo, presumivelmente a milícia Fano na província de Amhara. Os combatentes de Fano travaram uma batalha de dois dias com soldados etíopes em março. Segundo informações de Adis Abeba, mais de 300 milicianos foram mortos.

Eritreia e o reforço de posições

Num relatório recente, a organização norte-americana The Sentry, que investiga regularmente crimes de guerra, traçou a forma como a Eritreia reforçou a sua posição nos últimos anos. Especialmente através do seu envolvimento emTigray.

Charles Cater, chefe de investigações da Sentry, conta à DW que há dois padrões.

"Um deles foi a pilhagem industrial em grande escala de Tigray durante o conflito, em que fábricas inteiras foram desmanteladas e transportadas para o outro lado da fronteira", explica.

E a segunda dimensão, segundo Cater, "é aquilo a que chamamos oportunidades transfronteiriças, onde o ouro ilícito, o gergelim, o tráfico de seres humanos, as antiguidades, este tipo de atividades económicas transfronteiriças, na maioria dos casos ilícitas, persistiram em alguns casos após o conflito".

Diz-se que o Exército da Eritreia reforçou recentemente as suas posições na zona fronteiriça com Tigray. De acordo com "The Sentry”, as forças armadas também estão presentes até dez quilómetros para além da fronteira; ambos os lados aceitaram uma demarcação de fronteira renegociada durante o período de degelo, alguns anos antes.

Abiy Ahmed, primeiro-ministro da Eiópia, vai a eleições no próximo ano. Isso traz consigo o risco latente de que a situação em Tigray possa se tornar parte de um cálculo político.

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