Chapo desafiado a permitir investigação a crimes da polícia
16 de abril de 2025"Quem não deve não teme", adverte Manuel de Araújo. O autarca de Quelimane insta o Presidente de Moçambique, Daniel Chapo, a autorizar a missão de organizações não-governamentais para investigar os atos criminosos dos agentes da polícia e das forças de segurança durante os protestos ocorridos no país após o anúncio dos resultados das eleições de 9 de outubro de 2024.
"Se o chefe de Estado não teme, se Moçambique não teme, que permita a vinda de instituições como a Human Rights Watch, a Amnistia Internacional, a Comissão da ONU dos Direitos Humanos, como a Inter Watch, para que venham a Moçambique, ouçam os depoimentos daqueles que querem falar e, portanto, possam fazer o seu trabalho sem nenhum impedimento", desafia Manuel de Araújo.
O autarca, que esteve há dias em Lisboa, reagiu assim ao baleamento no domingo do músico Joel Amaral, conhecido por MC Trufafa, a que chamou de "ato bárbaro". O político moçambicano, que repudia atos bárbaros como este, insiste:
"Eu tenho conhecimento de que a própria Comissão das Nações Unidas para os Direitos Humanos, entre outras organizações internacionais, escreveu às autoridades moçambicanas pedindo permissão para virem fazer esse trabalho desde outubro ou novembro do ano passado. Já passam quase quatro meses e essas cartas ainda não foram respondidas", revelou o edil à DW.
"Terror" em Quelimane
O político moçambicano expressou "dor e consternação" pelo baleamento do "colega e irmão" Joel Amaral, funcionário do município da cidade de Quelimane. Araújo, autarca da cidade, alerta ainda sobre vários casos de assassinato e maus tratos de concidadãos da província alegadamente perpetrados por homens ligados às forças de defesa e segurança, vulgarmente conhecidos como "esquadrões da morte".
"Temos recebido informações de vários distritos da nossa província, onde alegadamente as forças de defesa e segurança ou elementos ligados às forças de defesa e segurança têm estado a fazer uma ‘caça ao homem', tornando-se em juízes, violando a Constituição da República de Moçambique, assassinando e tirando vidas a centenas de concidadãos nossos."
Manuel de Araújo diz mesmo que "há uma espécie de terror" nalguns dos distritos de Quelimane e, por isso, pede a intervenção do Presidente Daniel Chapo, como mais alto magistrado da nação, "para que mande parar esta perseguição a civis, esta perseguição a cidadãos nossos, estes assassinatos."
Amnistia Internacional apela a investigações independentes
Miguel Marujo, diretor de Comunicação da Amnistia Internacional Portugal, considera que "o ataque ao músico Joel Amaral merece o repúdio de todos os que querem um país pacificado, no qual a liberdade de expressão possa ser uma realidade e as vozes da oposição se possam ouvir sem medo."
Em declarações à DW, Marujo defende com urgência investigações independentes sobre este e outros casos contra apoiantes da oposição. "O ataque ao músico Joel Amaral reforça uma vez mais a necessidade destas investigações", frisa.
A Amnistia Internacional lançou esta quarta-feira (16.04) novo relatório "Protestos sob ataque: Violações dos direitos humanos durante a vaga de repressão após as eleições de 2024". O documento, baseado em entrevistas e análise de informação de fonte aberta, bem como em vídeos e fotos, relata como as forças de segurança dispararam armas letais, gás lacrimogéneo e balas de borracha contra manifestantes e transeuntes, incluindo crianças.
O relatório denuncia que as forças de segurança moçambicanas reprimiram de uma forma generalizada e com força excessiva e desnecessária, as manifestações que se seguiram às eleições de outubro passado, que resultaram em mortes ilegais e ferimentos graves.
Em 22 de janeiro de 2025, o Presidente Daniel Chapo declarou, numa entrevista à comunicação social, que o seu governo investigaria a situação e reconheceu as mortes tanto de cidadãos comuns como de agentes da polícia, diz o relatório.
Mas até hoje, as vítimas e familiares que falaram com a Amnistia Internacional não viram ser feita justiça pelas violações dos direitos humanos contra eles cometidas. De acordo com o documento, as autoridades moçambicanas devem levar à justiça os responsáveis por repressão imprudente e letal de manifestações.
Miguel Marujo afirma, em declarações à DW que, "embora os cuidados médicos, as indemnizações e os perdões sejam absolutamente necessários, a responsabilização exige que todos os suspeitos de autoria de crimes enfrentem a justiça em julgamentos justos, após investigações completas e transparentes."