Liberdade de imprensa atinge nível crítico sem precedentes
2 de maio de 2025O Índice de Liberdade de Imprensa atingiu, em 2024, um nível crítico sem precedentes e o declínio continua em 2025, revela o relatório anual divulgado esta sexta-feira (02.05), Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, pela organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF).
O estado global da liberdade de imprensa é agora classificado como "situação difícil" pela RSF, segundo a qual grande parte da situação deve-se "à concentração da propriedade [das empresas de comunicação social], à pressão dos anunciantes e financiadores e à ajuda pública restrita, ausente ou alocada de forma opaca".
Segundo dados recolhidos pela organização, em 160 dos 180 países avaliados (88,9%), os meios de comunicação social só alcançam resultados financeiros estáveis "com dificuldade" e muitos nem sequer os conseguem. "Pior ainda, os meios de comunicação social estão a fechar devido a dificuldades económicas em quase um terço dos países de todo o mundo", como é o caso dos Estados Unidos, da Tunísia ou da Argentina.
"Quando os meios de comunicação social enfrentam dificuldades financeiras, entram numa corrida para atrair audiências em detrimento de reportagens de qualidade e pode ser vítimas de oligarcas e autoridades públicas que procuram explorá-los", acrescentou a organização.
Segundo o relatório, em 34 países verificaram-se encerramentos em massa dos seus meios de comunicação, o que levou ao exílio de muitos jornalistas. Isto aconteceu sobretudo na Nicarágua, na Bielorrússia, no Irão, em Myanmar, no Sudão, no Azerbaijão e no Afeganistão, onde as dificuldades económicas agravam os efeitos da pressão política.
Cortes abruptos de Trump
Nos EUA, onde o indicador económico tem vindo a descer nos últimos dois anos, vastas regiões estão a transformar-se em desertos noticiosos. O segundo mandato do Presidente Donald Trump, iniciado em janeiro, intensificou esta tendência, com falsas previsões económicas que são utilizadas para colocar a imprensa sob pressão.
O fim abrupto do financiamento da Agência dos Estados Unidos para os Media Globais (USAGM), que afetou várias redações - incluindo a Voz da América (VOA) e a Rádio Europa Livre/Rádio Liberdade - levou mais de 400 milhões de pessoas em todo o mundo a ficarem subitamente privadas de acesso a informação fidedigna.
Também o congelamento do financiamento da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID) interrompeu a cooperação internacional dos EUA, lançando centenas de meios de comunicação num estado crítico de instabilidade económica e obrigando alguns a fechar - sobretudo na Ucrânia.
Estes graves cortes no financiamento constituem um golpe adicional numa economia já enfraquecida pelo domínio que gigantes tecnológicos como a Google, a Apple, o Facebook, a Amazon e a Microsoft têm sobre a divulgação de informação. Estas plataformas, em grande parte não regulamentadas, estão a absorver uma fatia cada vez maior das receitas publicitárias que normalmente apoiariam o jornalismo.
Além da perda de receitas publicitárias, a concentração da propriedade dos meios de comunicação social é outro fator-chave na deterioração do indicador económico do Índice de Liberdade de Imprensa e representa uma séria ameaça à pluralidade dos media.
O índice mostra que, em 46 países, a propriedade dos meios de comunicação está altamente concentrada e, em alguns casos, é totalmente controlada pelo Estado. Isto é evidente sobretudo na Rússia, onde a imprensa é dominada pelo Estado ou por oligarcas ligados ao Kremlin, e na Hungria, onde o Governo controla os meios de comunicação através da distribuição desigual de publicidade estatal, referiu a RSF.
Mesmo em países com classificações elevadas de liberdade de imprensa, como a Austrália, o Canadá, a República Checa ou a França, a concentração dos media é motivo de preocupação, porque suscita preocupações sobre a independência das redações.
Baixos indicadores económicos em África
Em África, os baixos indicadores económicos, a concentração de proprietários de meios de comunicação social e a pressão dos agentes publicitários prejudicam e comprometem a independência jornalística no continente, consideram os Repórteres Sem Fronteiras.
Segundo o Índice Mundial da Liberdade de Imprensa 2025, a "liberdade de imprensa está a sofrer um declínio preocupante em muitos países africanos". De uma forma geral, a região registou "o maior número de países com indicadores económicos em declínio, uma vez que 80% [dos países] viram os seus resultados económicos baixar."
Assim, segundo explicaram, "em muitos casos", os meios de comunicação social estão concentrados em grupos privados "próximos dos detentores do poder e de indivíduos com interesses públicos", o que "compromete a independência editorial das redações".
Consequentemente, de acordo a ONG, esta concentração de propriedade é "particularmente notória em países como a Nigéria (122.º lugar no ranking), a Serra Leoa (em 56.º lugar) e os Camarões (131.º lugar).
A conjuntura dos media em África é agravada pela dependência das receitas publicitárias, que "geralmente provêm dos orçamentos de comunicação do Estado e das grandes empresas. O setor dos media é também enfraquecido "pela falta de subsídios públicos consistentes e transparentes" e a ajuda governamental "é rara ou mal distribuída".
Além dos desafios de segurança, a ONG aponta que "as pesadas medidas judiciais e administrativas também afetam gravemente a saúde financeira dos meios de comunicação social". Em vários países africanos, as autoridades recorrem ao sistema judicial, ou a organismos estatais reguladores, para sancionar os media.
Os países africanos com pior classificação no índice são o Uganda (143.º), a Etiópia (145.º lugar) e o Ruanda (146.º lugar), que passaram este ano para a categoria "muito grave", e a Eritreia, que detém "o triste recorde das mais longas detenções de jornalistas no mundo", permanece em último lugar.
Em contrapartida, os países africanos melhor classificados são "a África do Sul (27.º lugar), a Namíbia (28.º lugar), Cabo Verde (30.º lugar) e o Gabão (41.º lugar).