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LAM multada por "roubar" os clientes à revelia do Governo

13 de agosto de 2025

Companhia aérea foi multada por vender bilhetes a preços abusivos, de forma ilegal. Caso está na PGR, mas sociedade civil não confia na instituição. Será o início do combate ao "nhonguismo"? LAM vai recorrer da decisão.

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Moçambique Maputo | Sede das Linhas Aéreas de Moçambique
Foto: Romeu da Silva/DW

A aplicação da sobretarifa (YQ), "sem fundamento legal e contabilístico" e em violação à ordem do então ministro da tutela, leva a Linhas Aéreas de Moçambique ( LAM ) a pagar uma multa de 11 milhões de meticais, o equivalente a 149 mil euros, depois de uma investigação da Autoridade Reguladora da Concorrência (ARC).

Para André Mulungo, colaborador da ONG Centro para Democracia e Desenvolvimento (CDD), a "LAM está em coma induzido e o Governo está em esforços de tentar resuscitá-la". Por isso, Mulungo tem a certeza que "essa sobretarifa foi aplicada como estratégia de assegurar a sobrevivência da LAM no cenário de crise profunda".

E o ativista questiona: "Porque é que nunca se fez nada, porque as pessoas que colocaram a LAM na situação em que se encontra são as pessoas que dirigem este país?". Mulungo entende que a ilegalidade foi feita de duas formas: "A primeira: má gestão e corrupção e a segunda, usarem a LAM sem precisarem de pagar os bilhetes, como aconteceu com o partido FRELIMO [no poder]. Todos nós sabemos disso."

Desrespeito ao Estado

Num gesto considerado incompreensível e até desrespeitoso, as Linhas Aéreas de Moçambique (LAM) também não terão demonstrado vontade em colaborar com a investigação da Autoridade Reguladora da Concorrência (ARC), o que lhe valeu uma penalização.

Alexandre Chiúre é jornalista e lamenta "que isso tenha acontecido". Lembra que "apesar da LAM ser uma empresa privada, tem acionistas do Estado: A Emose, os Caminhos de Ferro de Moçambique (CFM) e a Hidroelética de Cahora Bassa (HCB)".

"São acionistas selecionados pelo Governo para intervir e evitar a falência total da LAM. O facto de serem uma empresa privada não lhes isenta da obrigação de comunicar as suas decisões [ao Estado]. Eles não têm independência total de decisões", destaca o jornalista.

Avião da Linhas Aéreas de Moçambique
LAM anunciou, em conferência de imprensa, esta terça-feira, que vai decorrer da decisãoFoto: Johannes Beck/DW

LAM vai recorrer

Entretanto, numa conferência de imprensa, esta terça-feira (12.08), em Maputo,  o presidente da comissão de gestão da LAM, Dane Kondic,  garantiu que a companhia aérea vai recorrer da sanção da ARC, alegando que a entidade não levou em consideração a argumentação da transportadora aérea.

"Nós não concordamos com a decisão, baseado no que sabemos, mas há um fórum a que podemos levar o nosso caso e nós acreditamos que todos os factos, tanto quanto sabemos, não foram tomados totalmente em consideração", disse.

Segundo Kondic, a nova gestão da LAM "não tem nada a ver" com a situação decidida pela Autoridade Reguladora: "Nenhum de nós aqui teve alguma responsabilidade com o caso que foi levado contra a LAM, no ano de 2020, mas nós estamos aqui para tentar resolver esses assuntos".

Terá sido durante a direção de João Pó Jorge que a LAM decidiu à revelia aplicar as sobretarifas, um pedido que terá sido negado pelo Governo em 2021. Uma aparente insubordinação que não terá sido corrigida, porquê? Num país de "ordens superiores", é possível tomar uma decisão sem o consentimento da hierarquia?

Mulungo é peremptório: "Se ele aceitou cumprir ordens superiores deve ser levado à barra da justiça, ser responsabilziado à luz da lei e depois dizer quem são essas pessoas que o mandaram fazer isso para essas pessoas serem responsabilizadas".

PGR ignora "Nhonguismo" 

Recentemente, o Presidente da República, Daniel Chapo, denunciou corrupção na gestão da LAM, o famoso "nhonguismo". Ainda assim, a Procuradoria-Geral da República (PGR), publicamente, demonstrou ter feito ouvidos moucos. Porém, o CDD decidiu destapar os ouvidos à instituição, submentendo-lhe o caso com todas as letras.

Mas a ONG não está satisfeita com a nova PGR indicada por Chapo: "A PGR já deveria estar a agir, há várias denúncias de crimes públicos cometidos pelos gestores da LAM e a PGR não age. Não o faz porquê? Porque está comprometida com este sistema de gangster todo que está a gerir este país."

Em Moçambique, não é comum instituições estatais se denunciarem por más práticas, reina uma espécie de "proteção na irmandade". A atitude da Autoridade Reguladora da Concorrência de levar agora o caso à PGR, uma iniciativa considerada pioneira, pode ser entendida como uma espécie de marco de combate ao "nhonguismo"?

Etiópia| Presidente de Moçambique, Daniel Chapo, na Cimeira da UA
Recentemente, o Presidente de Moçambique, Daniel Chapo, denunciou corrupção na LAMFoto: Amanuel Sileshi/AFP

"Pode ser o fim do nhonguismo, mas ele deve ser o resultado de uma agenda do Estado de combate à corrupção, e esta agenda não existe nos vários governos do partido FRELIMO", responde Mulungo.

"O que acontece muita vezes é que temos um novo regime que persegue o regime anterior, mas, no fundo, o novo regime continua a fazer a corrupção", denuncia.

Para o CDD, uma medida isolada como esta não é satisfatória. Mulungo frisa que a perseguição aos criminosos é uma responsabilidade institucional, não deve decorrer apenas no âmbito de uma luta entre facções partidárias [na FRELIMO].

O pródigo protegido?

Osprejuízos da LAM dispararam para 3.977 milhões de meticais (53,5 milhões de euros) em 2023, obrigando o Estado a injetar mil milhões de meticais (13,7 milhões de euros) e a emitir uma carta conforto em 2024. A empresa LAM, que não tem divulgado contas publicamente, tinha registado prejuízos de 448,6 milhões de meticais (seis milhões de euros) em 2022.

Sobre a debilidade financeira, o jornalista Alexandre Chiúre não tem dúvidas de que se trata de um fardo pesadíssimo para os cofres do Estado.

"É uma companhia que tem estado a dar muito problemas, está a dever a quase todo o mundo aqui. Até há bem pouco tempo as estatísticas mostravam que está a dever aos fornecedores e provedores de serviços qualquer coisa como 300 milhões de dólares", revela.

2022: O que esperar da luta contra a corrupção?

Jornalista da DW Nádia Issufo
Nádia Issufo Jornalista da DW África
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