Ibrahim Traoré: Herói nas redes sociais, autocrata em casa?
9 de setembro de 2025O capitão Ibrahim Traoré tornou-se um fenómeno da Internet desde que governa o Burkina Faso, após o golpe de Estado em setembro de 2022. É celebrado como um líder pan-africano e muitas vezes comparado a grandes figuras simbólicas da independência africana.
Nas redes sociais, crescem páginas que promovem uma figura de liderança que "choca o Ocidente” ou que tem "planos secretos” para transformar o país – um dos mais pobres do mundo – na principal potência económica africana.
À DW, Paul Melly, do centro de estudos Chatham House, realça a repercussão além-fronteiras de Traoré: "Internacionalmente, Ibrahim Traoré tem a imagem de um jovem líder revolucionário que desafia a antiga potência colonial francesa. Mesmo nas redes sociais de língua inglesa, na África Ocidental e na diáspora, ele está realmente a ter um grande impacto”.
No entanto, há visões contraditórias e a avaliação de organizações de direitos humanos é menos positiva. No seu próprio país, Traoré restringe as liberdades civis, criminaliza a homossexualidadee reprime qualquer crítica.
Prometeu eleições democráticas, que não aconteceram. Em vez disso, Traoré reestruturou as forças armadas e nomeou um Governo que lhe era favorável. As vozes da oposição e os meios de comunicação são cada vez mais reprimidos.
Após o golpe de Estado, Traoré prometeu também que, em seis meses, colocaria fim ao terrorismo no Burkina Faso, mas não conseguiu cumprir a promessa.
O sucesso da retórica antiocidental
Paul Melly afirma que "provavelmente 70% do território do país está sob o controlo de grupos armados jihadistas, ou pelo menos fora do controlo seguro do Governo”.
O líder militar fez uma limpeza profunda nas relações de cooperação. O Burkina Faso entrou em rota de colisão com a França, aliou-se aos vizinhos Níger e Maliformando a Aliança dos Estados do Sahel (AES), abandonou a CEDEAO e encontrou naRússia o novo parceiro forte.
O sucesso de Traoré centra-se na retórica antiocidental e, em especial, na oposição à França. Uma retórica que, na opinião de críticos, encobre retrocessos e restrições às liberdades civis.
O jornalista queniano Patrick Gathara ressalva: "Acho que as pessoas, na essência, estão à procura de salvadores. E isso é parte do meu desconforto com essa polarização, com pessoas como Ibrahim Traoré".
"As pessoas têm de ter cuidado ao apoiar essas figuras como panaceias para aquilo são essencialmente problemas sistémicos”, alerta Gathara.
O empenho do regime militar em cortar laços com o Ocidente traz consequências, sublinha Ousmane Aly Diallo, da Amnistia Internacional: "Isso reflete-se nos costumes e tradições da sociedade burquinabé, onde se usa esse desejo de soberania para impor medidas discriminatórias e que violam a igualdade das pessoas perante a lei”
Na semana passada, a Assembleia Legislativa de Transição do país aprovou um projeto de lei que prevê até cinco anos de prisão para quem pratique "atos homossexuais". A lei também traz a marca de um regime autoritário em outros pontos, por exemplo, permite a revogação da cidadania adquirida de pessoas que critiquem o Governo do capitão Ibrahim Traoré.