Guterres: "Sistema de ajuda de Israel está a matar em Gaza"
28 de junho de 2025O secretário-geral da ONU, António Guterres, alertou hoje que o sistema de ajuda imposto por Israel em Gaza "está a matar pessoas", sublinhando que "qualquer operação que leve civis desesperados para zonas militarizadas é, inerentemente, insegura".
António Guterres referia-se às operações de ajuda lideradas pelo Fundo Humanitário de Gaza, uma organização criada pelos Estados Unidos e aceite por Israel para distribuição de ajuda ao enclave, e que funciona à margem da ONU.
As distribuições de alimentos desse Fundo levaram a numerosos episódios de caos e violência, com a intervenção do exército israelita, que disparou contra palestinianos que procuravam comida em diversas ocasiões.
Israel negou hoje ter atirado "deliberadamente" contra civis em pontos de distribuição de comida. O Ministério dos Negócios Estrangeiros israelita também acusou a ONU de "alinhar com o Hamas", depois de o secretário-geral da organização ter criticado o sistema de assistência humanitária imposto por Telavive em Gaza.
Além disso, o governo do Hamas na Faixa de Gaza informou ontem que alguns palestinos que recolheram sacos de farinha dos centros de ajuda israelenses e americanos encontraram comprimidos de oxicodona, um opiáceo altamente viciante, dentro deles. Entretanto, a Agência EFE não conseguiu verificar essa alegação de forma independente, nem por meio do Ministério da Saúde.
Mortes
No total, mais de 500 pessoas morreram durante a distribuição de alimentos. Entretanto, o jornal israelita Haaretz publicou uma investigação que dava conta que soldados israelitas encarregados de supervisionar a entrega de alimentos receberam ordens para disparar deliberadamente contra a multidão, antes e depois da distribuição.
Ao ser questionado sobre essa reportagem, Guterres respondeu: "não precisamos de reportagens dessa natureza para reconhecer que houve violações maciças do direito internacional. E, de facto, quando há uma violação do direito internacional, deve haver responsabilização".
"As pessoas estão a ser mortas simplesmente a tentar alimentar-se a si e às famílias. A procura de alimento nunca deve ser uma sentença de morte", declarou.
"Israel, como potência ocupante, tem a obrigação de aceitar e facilitar a ajuda humanitária", acrescentou.
Para Guterres, não há necessidade de aplicar modelos perigosos de distribuição de ajuda quando a ONU já tem "um plano detalhado baseado nos princípios humanitários de humanidade, imparcialidade, neutralidade e independência".
ONU na Faixa Gaza
A desconfiança do Governo israelita na ONU tem vindo a crescer no último ano: não só falta comunicação com o Secretariado e os órgãos executivos, mas o Governo de Benjamin Netanyahu equaciona igualmente desconsiderar todas as agências da ONU a operar em Gaza.
"Temos os produtos e a experiência, e o nosso plano foi criado para atender às necessidades das pessoas. Baseia-se na confiança das comunidades, dos doadores e dos Estados-membros", acrescentou o antigo primeiro-ministro português.
Hoje, a organização não-governamental Médicos Sem Fronteiras também afirmou, em Genebra, que o modelo de assistência imposto por Israel "deve ser desmantelado imediatamente", porque "degrada deliberadamente a população palestiniana, forçando-a a escolher entre morrer de fome ou arriscar a vida por ajuda mínima".
Este sábado, pelo menos 12 pessoas morreram em decorrência de um ataque aéreo israelita na Faixa de Gaza, incluindo três irmãos que estavam em sua tenda em Al Mawasi, no sul de Khan Younis, de acordo com fontes médicas citadas pela agência de notícias palestina “Wafa”.
Um total de seis pessoas morreram nesse ataque; enquanto no norte, pelo menos duas pessoas foram mortas no bombardeio israelense à escola Adnan Al Alami, que abriga deslocados a noroeste da Cidade de Gaza, enquanto mais duas crianças foram mortas em um ataque a uma casa em Jabalia.
Segundo contagem divulgada hoje, o número de mortos na Faixa de Gaza em decorrência dos ataques israelitas passou de 56.400, após 81 corpos chegarem aos hospitais do enclave ontem, informou o Ministério da Saúde local em sua contagem diária, que não inclui mortes indiretas por doença ou pelo colapso do sistema sanitário
O Presidente norte-americano, Donald Trump, sublinhou hoje que "é possível ser alcançado um cessar-fogo na Faixa de Gaza, entre Israel e o Hamas, na próxima semana".