Guerra dos 12 dias: "Foi a primeira vez que a casa abanou"
1 de julho de 2025"É uma sensação de impotência. Aquela sensação de ‘oh meu Deus, eu vou morrer aqui'. Não há palavras". É assim que Sílvia Carvalho descreve os 12 dias de guerra entre Israel e o Irão.
A bióloga portuguesa vive em Israel desde 2011 e, em entrevista à DW, começou por contar o que acontecia nos momentos que antecediam a chegada dos mísseis. "Recebemos um alerta nos telemóveis que apita de uma maneira que ativa tudo o que é stress e depois começamos a receber mensagens a dizer 'dentro de alguns minutos vai ouvir sirenes na zona, procure uma zona de abrigo'", relata, acrescentando que só saem quando recebem novas diretivas.
"Quase não saio de casa. É casa-trabalho e trabalho-casa e é uma situação muito stressante", revela, explicando que, após o aviso inicial, tem 10 minutos para chegar até ao abrigo e que "às vezes não há tempo".
O conflito entre Israel e o Irão começou a 13 de junho. Israel atacou instalações nucleares e militares em território iraniano, justificando a investida com o programa nuclear iraniano, que o Governo israelita descreve como uma ameaça existencial. Teerão diz que o programa tem apenas fins pacíficos e retaliou com centenas de mísseis e drones.
Em apoio a Israel, os Estados Unidos bombardearam três importantes instalações nucleares no Irão. O conflito terminou pouco depois, a 24 de junho. Após 12 dias de incerteza e instabilidade, a investigadora relata como viveu os momentos de tensão no abrigo da sua casa - um "quarto com uma espécie de porta corta-fogo, sem circulação de ar nem luz" - sublinhando, ainda assim, o "privilégio" de ter um.
"Há pessoas que não têm abrigos dentro de casa, portanto, têm de ir para a rua ou para as caves dos prédios", ressalta, exemplificando: "imagine às três da manhã começarem estas sirenes e ter de agarrar em miúdos e as pessoas de idade terem de correr para os abrigos". "Surreal" é a palavra que repete.
Míssil iraniano destrói "anos de investigação"
No dia 15 de junho, pelas três da manhã, um míssil iraniano atingiu o Instituto de Ciências Weizmann em Rehovot, a sul de Telavive, um dos mais importantes centros científicos de Israel e onde Sílvia Carvalho trabalha. Embora, na altura, a investigadora estivesse em casa, o ataque foi sentido. "Acordei sobressaltada a correr para o abrigo. Foi a primeira vez da minha vida que a minha casa abanou completamente. Pensei: 'é desta'", admite.
Apesar de ninguém ter morrido no ataque, este causou danos consideráveis em vários laboratórios, destruindo "anos de investigação científica". "Uma máquina pode-se comprar outra, mas há certas coisas que nunca mais vão ser recuperadas", lamenta.
A investigadora admite que já teria regressado a Portugal, não fosse a doença crónica do marido, que é israelita. Acrescenta ainda que sente algum alívio por não ter filhos, tendo em conta a realidade que observa no bairro.
"Há muitos miúdos a brincar na rua e quando começamos a ouvir estes avisos começam aos gritos e a correr para casa, porque têm de ir para o abrigo. Não dá para descrever", aponta, sublinhando que, "podendo, deixo Israel, sem dúvida alguma".
Centenas de vítimas mortais
O conflito causou centenas de mortos em ambos os países. Segundo a agência oficial iraniana Irna, o Irão registou a morte de 935 pessoas durante os ataques israelitas. Em Israel, de acordo com as autoridades, os ataques iranianos causaram a morte de 28 pessoas.
Em duas semanas de ataques, Israel afirmou ter atingido oito instalações nucleares e mais de 720 locais de infraestruturas militares. O Irão disparou cerca de 550 mísseis balísticos contra Israel, a maioria dos quais foi intercetada. O cessar-fogo, mediado pelos EUA, foi declarado no dia 24, mas a situação mantém-se tensa.
Este domingo (29.06), o Governo iraniano pediu à ONU que reconheça Israel e os Estados Unidos como responsáveis pela guerra. Já o Governo israelita pediu às potências europeias envolvidas nas negociações nucleares que reativem as sanções contra a república islâmica, por incumprimento das obrigações estabelecidas em acordo.