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"É de bradar aos céus a situação que estamos a viver"

6 de agosto de 2025

À DW, ativista diz que na base do problema está "infraestrutura deficiente de produção, armazenamento e distribuição", especulação dos preços e falta de vontade política.

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Segundo Édson Vieira Neto, o preço da botija de gás passou de 1.500 para 2.500 Kwanzas
Segundo Édson Vieira Neto, o preço da botija de gás passou de 1.500 para 2.500 KwanzasFoto: Simão Lelo/DW

Em Luanda, a escassez do gás de cozinha está a deixar milhares de famílias em dificuldades. Há relatos de longas filas, preços inflacionados e muita incerteza quanto ao abastecimento.

Enquanto os cidadãos denunciam a falta do produto, a SonaGás garante que há stock suficiente e desvaloriza a situação.

À DW África, o ativista social Édson Vieira Neto, um consumidor que denunciou a situação nas redes sociais, diz que na base do problema está "uma infraestrutura deficiente de produção, armazenamento e distribuição”, especulação dos preços e falta de vontade política.

DW África: Falta gás em Angola?

Édson Vieira Neto (EVN): A questão não é assim tão simples: se há ou não há. Estamos a falar de uma infraestrutura deficiente de produção, de armazenamento e de distribuição de gás de cozinha. Essa estrutura é, muitas vezes, inadequada e obsoleta. Isso leva a interrupções no fornecimento, fugas e perdas durante o transporte. Diminui se a quantidade de gás disponível para o consumo. E depois, temos a especulação. Então, há uma série de fatores que acabam por levar-nos a esse tipo de situações. Mas dizer que não há gás, creio que seria um bocado excessivo. O gás existe nalguns centros com uma fraca distribuição, como disse, mas com preços elevados, frutos mesmo dessa especulação.

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DW África: E falando desta especulação, neste momento, a quanto é que se compra gás em comparação com o preço que anteriormente era praticado?

EVN: Nós estamos a falar das botijas que custam 1.500 kwanzas (o equivalente a 1,41 euros), que acho que é de 1,5 litros, se não estou em erro, que custa 1.500 não oficial, mas que depois são vendidas a 2.500 kwanzas (cerca de 2,35 euros).

DW África: Quais são os principais fatores que podem explicar essa situação, em Luanda, apesar das garantias da DonaGás de que tem stock suficiente e não há crise?

EVN: Durante muitos anos, houve pouco investimento na modernização da indústria do gás, a ausência de capital para investir ou para construir novas fábricas, novas redes de distribuição e pontos de venda – o que significa capacidade de produção. Assim, não se conseguiu acompanhar o aumento da procura, que cresceu também com o aumento da população e com aquilo que muitos chamam desenvolvimento urbano.

Há um monopólio na produção. A produção de gás continua a ser dominada por muito poucas empresas, o que limita a concorrência. A falta de outros produtores no mercado leva também a que não haja pressão para baixar os preços. A produção é controlada para manter os preços elevados. O Governo continua a impor um preço máximo para o gás que, embora pareça ser benéfico para a população, acaba por desincentivar o investimento privado.

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DW África: E de que forma também a greve dos taxistas pode ter impactado a cadeia de distribuição?

EVN: De certeza absoluta que afetou porque a mobilidade diminuiu drasticamente durante este período, os preços subiram consideravelmente. Estamos a falar em percentagens absurdas para a nossa realidade. De certeza absoluta que encareceram também os custos de distribuição destes distribuidores.

DW África: A curto prazo, o que acha que poderá acontecer em termos de produção de gás? A escassez ou a especulação de preços?

EVN: Nós estamos num processo que é sempre a descer, porque não há vontade política para fazer as coisas acontecerem de maneira diferente. E nesse exato momento estamos a falar de um Estado, não diria falido, mas com passe a expressão, "com as cuecas na mão”, inclusive para pagar salários - algo que até a alguns anos era impensável: Portanto, é de bradar aos céus a situação que estamos a viver.

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Braima Darame - Jornalista DW
Braima Darame Jornalista da DW África