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Ângela Leão e Ndambi Guebuza em liberdade condicional

17 de junho de 2025

Os dois arguidos do caso das dívidas ocultas em Moçambique saíram hoje da cadeia em liberdade condicional. Para jurista, "não se pode falar do cumprimento da metade da pena", argumento usado para a soltura.

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Ndambi Guebuza, filho do antigo Presidente moçambicano Armando Guebuza, cumpria uma pena de 12 anos de prisão
Nbambi Guebuza, filho do antigo Presidente moçambicano Armando Guebuza, cumpria uma pena de 12 anos de prisãoFoto: Romeu da Silva/DW

Ângela Leão e Ndambi Guebuza, dois dos arguidos do caso das dívidas ocultas em Moçambique, que lesou o país em cerca de 2,7 mil milhões de dólares, saíram hoje da cadeia em liberdade condicional.

Nbambi, filho do antigo Presidente moçambicano Armando Guebuza, cumpria uma pena de 12 anos. Ângela Leão, esposa do ex-diretor da secreta moçambicana, Gregório Leão, foi condenada a 11 anos de prisão.

Os dois abandonaram os calabouços com o argumento de terem cumprido a metade da pena. Mas, à DW, o jurista Ivan Maússe diz que este princípio não procede, porque "as sentenças ainda não transitaram em julgado”. Para ele, o Ministério da Justiça deve esclarecer o caso para evitar a perceção de que "o crime compensa".

Maússe sugere ainda que se atualize a legislação referente a crimes financeiros, de forma a se evitar penas brandas e garantir que os bens voltem aos moçambicanos.

DW África: Como é que reage a estas solturas?

Ivan Maússe (IM): Acho que é o resultado da sentença que foi lida no caso das dívidas ocultas. Muito embora estranha o fato de que, até onde nós sabemos, foram submetidos recursos a respeito deste caso. Ou seja, os indivíduos implicados nas dívidas ocultas ainda continuavam em situação de prisão preventiva, uma vez que as sentenças que foram lidas e que condenam esses indivíduos foram submetidas a recurso e nós sabemos que o recurso, em Moçambique, tem efeito suspensivo.

DW África: Ou seja, está a dizer que o argumento de que eles já cumpriram a metade da pena não procede, tendo em conta que as penas ainda não transitaram em julgado, é isso?

IM: O que acontece é o seguinte, do ponto de vista daquilo que é o cumprimento da metade da pena, só é aceitável a aplicação desse instituto a partir do momento em que os indivíduos já foram condenados por sentença transitada em julgado.

Claramente, junta-se o tempo em que os mesmos ficaram detidos preventivamente e o tempo em que a sentença que aplica a coordenação começou a contar. Ao que parece neste momento da data em que a sentença foi lida até esta parte, não se pode falar do cumprimento da metade da pena, porque houve recurso que foi submetido junto de um tribunal superior e o recurso tem feito suspensivo.

Veja imagens da audição de Ndambi Guebuza

DW África: E lembramos que, por exemplo, no período do julgamento deste caso, o juiz chegou a dizer que a essas pessoas era negado o cumprimento do término da prisão preventiva pelo risco que elas representavam no processo de produção de provas.

IM: Pois. E é estranho porque, de facto, quando se aplica o instituto da prisão preventiva é mesmo para evitar que haja risco de fuga, claramente. Mas também, e sobretudo, para que não haja deturpação do andamento normal do processo, até porque não está em andamento a questão relativa à recuperação de alguns arquivos que foram objeto das dívidas ocultas.

Portanto, é uma situação meio complicada. Tanto mais que eu referi inicialmente que era importante que aparecesse uma voz autorizada junto do Ministério da Justiça a esclarecer muito bem aos moçambicanos por que razão esses indivíduos estão a ser libertos para não se gerar também a ideia de que o crime compensa.

DW África: Pela forma como essas pessoas estão a sair hoje, comprova-se aquela tese de que as penas do caso das dívidas ocultas foram brandas tendo em conta a dimensão do caso e os estragos que esse caso teve para o tecido social moçambicano?

IM: Sem dúvidas. Do ponto de vista daquilo que é o olhar social, ou seja, do povo moçambicano, é de que o julgamento [do processo] das dívidas ocultas não passou de um teatro e que as penas que foram aplicadas não foram de todo justas, tendo em conta o dano financeiro que foi causado aos moçambicanos.

No entanto, é preciso que façamos uma reflexão. Ver se, de facto, perante essa experiência que nós tivemos das dívidas ocultas, é importante ou não atualizar a nossa legislação para que pessoas que cometem crimes financeiros da dimensão ou próxima à dimensão das dívidas ocultas não sejam premiadas com penas brandas. E, mais do que isso, garanta-se que os bens que esses indivíduos subtraíram dos moçambicanos voltem aos moçambicanos.

Porque o que acontece neste momento é que larga parte dos bens que foram desviados, sobretudo o dinheiro dessas dívidas ocultas, não poderão ser recuperados - o que gera um sentimento de frustração, [dando a entender] que, de facto, a justiça em Moçambique só protege os mais fortes e desprotege os mais fracos.

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