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Diálogo: "Falta informação sobre processo na diáspora"

11 de setembro de 2025

Auscultação pública nacional, que incluirá moçambicanos na diáspora, "é uma iniciativa que tem mérito e demérito", diz à DW jornalista moçambicano radicado em Portugal. "Contributo de Mondlane será sempre útil", defende.

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Maputo 2025 | Presidente de Moçambique, Daniel Chapo
Presidente de Moçambique, Daniel Chapo, acaba de lançar uma auscultação pública nacional, que incluirá a diáspora, sobre o diálogo político.Foto: Carlos Uqueio/AP Photo/picture alliance

A auscultação pública nacional, lançada esta semana pelo Presidente de Moçambique, Daniel Chapo, sobre o diálogo político para a pacificação do país, e que incluirá os moçambicanos na diáspora, "é uma iniciativa que tem o seu mérito, mas também tem o seu demérito". É a opinião de Manuel Matola, jornalista moçambicano radicado em Portugal, entrevistado a propósito pela DW.

O analista questiona se a auscultação será feita na lógica de contributo individual ou coletivo, lamentando, por outro lado, não haver ainda "informação clara" sobre o processo a nível da diáspora.

Manuel Matola questiona ainda se as contribuições que serão dadas no âmbito do diálogo inclusivo não irão anular a plataforma que foi criada para substituir a Agenda 2025. "O que vai vingar no fim deste diálogo inclusivo? Serão as ideias que sairão deste diálogo ou será o documento já promovido pelo próprio Estado no sentido de olhar para o futuro de Moçambique até 2040?", questiona.

O jornalista considera útil o contributo de Venâncio Mondlane enquanto líder partidário, fundador do Aliança Nacional para um Moçambique Livre e Autónomo (ANAMOLA).

"Venâncio Mondlane, enquanto líder partidário, tem de ser uma pessoa sempre a ser ouvida. A questão aqui é que há um conflito que começa a ser criado entre aquela formação política que apoiou a candidatura do Venâncio Mondlane e o próprio Venâncio Mondlane, que quer reivindicar os seus passos enquanto líder partidário desta nova formação política", refere Matola.

Maputo 2025 | Político moçambicano Venâncio Mondlane
ANAMOLA, novo partido de Venâncio MondlaneFoto: Jaime Álvaro/DW

Deutsche Welle (DW): O Presidente de Moçambique, Daniel Chapo, acaba de lançar uma auscultação pública nacional, que incluirá a diáspora, sobre o diálogo político para a pacificação do país. Como a diáspora quer ser integrada neste processo de diálogo inclusivo?

Manuel Matola (MM): Segundo o que se diz, haverá uma plataforma a ser criada para que as pessoas possam contribuir com as suas ideias, com os seus pensamentos relativamente àquilo que se pretende avançar no sentido de renovar ou refundar eventualmente o Estado moçambicano, a partir das propostas que vão ser lançadas. O que noto cá em Portugal, sobretudo, de um breve contacto que fiz com parte da comunidade, é que ainda não há uma informação muito clara sobre como é que este diálogo vai ocorrer a nível da diáspora. Se vai ser numa lógica de contributo individual ou se vai ser numa lógica de contributo coletivo. E é esta falta de informação que, pelo menos até agora, eu tenho e acredito que muitas outras pessoas também ainda não saibam como resolver esta situação.

Mas, apesar de tudo, é uma iniciativa que tem o seu mérito e também tem o seu demérito, porquê? Porque contraria um bocado aquilo que é a lógica de contribuição dos cidadãos numa democracia. Ou seja, há que reparar que há mecanismos já predefinidos que fazem com que as pessoas contribuam a partir das iniciativas de grupos da sociedade civil, que vão para o Parlamento e que fazem ou podem contribuir para fazer alteração àquilo que é o normal funcionamento do Estado.

Neste momento, o que noto é que há um exercício da parte do Governo do dia, no sentido de ganhar alguma autoridade, algum reconhecimento público depois daquilo que aconteceu nas eleições passadas, em que o Governo que saiu das eleições foi muito contestado. Então, há um exercício no sentido de legitimar a sua presença, a sua existência enquanto Governo e este exercício pode, de uma ou de outra forma, corroer um bocado aquilo que é a lógica de funcionamento da democracia.

DW: A diáspora moçambicana é abrangente e diversificada. Quais são os setores que poderiam ser incluídos?

(MM): Eu quero acreditar que uma das discussões que pode ser útil é ao nível da representação da diáspora. Até hoje, a nossa diáspora é representada apenas por um deputado, da Europa e o resto do mundo, e depois temos outro deputado que representa a África . No caso da representação ao nível da Europa, que é o espaço onde eu estou, acho que há uma falta de representação.

Se formos reparar, por exemplo, em países como Cabo Verde, que tem já essa tradição de indicação de deputados na diáspora, há um que é escolhido em representação do partido que ganha as eleições e de um representante da oposição. Ou seja, para o caso de Cabo Verde, é fácil um cidadão na diáspora contribuir com ideias que coincidam com ideias da oposição, sendo que para o caso de Moçambique dificilmente conseguirá colocar as suas ideias quando essas ideias forem contrárias àquilo que representa a posição do partido no poder que tem o seu deputado eleito na diáspora.

DW: Há critérios definidos, mas acha que tais critérios determinados pelas autoridades competentes em Moçambique são válidos ou não?

(MM): Há critérios que estão definidos, mas pela discussão que tem estado a ocorrer, nomeadamente ao nível da oposição, parece haver um exercício no sentido de ganhar-se um protagonismo. Eu pude acompanhar as discussões que houve entre Venâncio Mondlane, que tem agora o seu novo partido, e o líder do PODEMOS, Albino Forquilha, que diz que Venâncio Mondlane não deve aparecer na lógica de reivindicação de um espaço na comissão técnica e tende a aparecer como cidadão, porque há aqui um espaço que é criado para os cidadãos e há um espaço que é criado para os partidos políticos que fazem parte da plataforma.

DW: Considera que os moçambicanos no exterior se sentem incluídos ou excluídos do ponto de vista prático?

(MM): Os moçambicanos na diáspora têm um nível de consciência democrática muito elevado, até porque têm a possibilidade de estar num contexto de discussão muito mais aberto, têm a possibilidade de ter o acesso a informação mais rebuscada, e isso faz com que  estejam preparados para discutir. Aliás, as manifestações que ocorreram durante aquele período de turbulência em Moçambique fez-se notar em quase toda a diáspora, e isso significa alguma coisa relativamente à consciência dos próprios moçambicanos que estão espalhados pelo mundo.

Maputo 2025 l Protestos
Moçambicanos querem propostas que ajudem a pacificar o país e melhorar as suas condições de vidaFoto: Silaide Mutemba/DW

DW: Venâncio Mondlane, líder do recém-constituído partido ANAMOLA, reivindica participar nesse diálogo inclusivo, apesar da lei moçambicana não lhe permitir isso. O que acha da exclusão de Venâncio Mondlane na linha dos objetivos da Comissão Técnica para o Diálogo Nacional (COTE), sabendo-se que o partido de Mondlane surge depois do acordo assinado a 5 de março com os principais líderes da oposição? Venâncio Mondlane deve ou não integrar a tal Comissão (COTE)?

(MM): Eu continuo a pensar que o contributo de Venâncio Mondlane enquanto líder partidário será sempre útil, mas a questão de fundo cá talvez nem seja esta. A questão de fundo é que Moçambique, há 25 anos, definiu uma agenda que se chamava Agenda 2025, que foi renovada recentemente por uma outra agenda que vai até 2040.

A minha questão é saber de que forma os contributos que serão apresentados no âmbito do diálogo inclusivo irão coincidir ou irão anular aquilo que é a plataforma que foi criada recentemente para substituir a Agenda 2025. De uma forma mais simples, a minha questão é: o que vai vingar no fim deste diálogo inclusivo? Serão as ideias que sairão deste diálogo ou será o documento já promovido pelo próprio Estado no sentido de olhar para o futuro de Moçambique até 2040?

DW: Sendo Venâncio Mondlane o rosto das manifestações de protesto pós-eleitorais, não será esta uma via para a tal desejada pacificação e estabilidade de Moçambique?

(MM): O Venâncio Mondlane, enquanto líder partidário, tem de ser uma pessoa sempre a ser ouvida. A questão aqui é que há um conflito que começa a ser criado entre aquela formação política que apoiou a candidatura do Venâncio Mondlane e o próprio Venâncio Mondlane, que quer reivindicar os seus passos enquanto líder partidário desta nova formação política. E estas discussões vão criar aqui algum burburinho, porque não saberemos o que isso vai representar.

Diálogo em Moçambique: Quem representa a sociedade civil?

Há uma lei que sustenta este diálogo político, a partir desta plataforma onde estão integrados os partidos da oposição. Mas são partidos da oposição que, face os resultados eleitorais e face à realidade de hoje, nota-se que elas não têm essa representação. Se estes partidos, que estão no Parlamento, como é o caso da RENAMO, o MDM e o PODEMOS, são realmente a representação daquilo que Moçambique é hoje, é representante das pessoas, do povo, se quisermos dizer, do povo ou de uma parte da sociedade moçambicana que terá votado no PODEMOS, a partir do rosto do Venâncio Mondlane?

João Carlos Correspondente da DW África em Portugal