Cólera em Angola: "Governo tem de oferecer água potável"
14 de maio de 2025A cólera já se espalhou por 18 das 21 províncias de Angola e, neste fim de semana, foi confirmada a presença da doença na Lunda Norte, conforme informou o Ministério da Saúde. Amostras suspeitas estão atualmente em análise laboratorial.
As autoridades locais apelam à população para que adote medidas de prevenção rigorosas, com o objetivo de controlar e conter o avanço da epidemia.
Desde o início do ano, a cólera já provocou 609 mortes no país. Luanda, epicentro da doença, concentra o maior número de casos, com 208 óbitos confirmados até o momento.
Em entrevista à DW África, o médico angolano Domingos Cristóvão comenta as dificuldades enfrentadas pelo Ministério da Saúde no combate à epidemia. Segundo o docente universitário, o controle da doença passa, de forma crucial, pela melhoria das condições sanitárias no país. No entanto, o especialista em saúde pública rejeita a ideia de um "colapso" no sistema de saúde, afirmando que não há falta de medicamentos nas unidades sanitárias.
DW África: Porque é que o Ministério da Saúde não consegue controlar a cólera?
Domingos Cristovão: O grande problema está relacionado com a tríade epidemiológica. A cólera é uma doença hídrica, portanto, de transmissão por água por conta dos micróbios que se encontram nas fezes espalhadas por todo lado e a falta de higiene, a defecação ao ar livre. O acesso à água potável não está nos níveis adequados e a higiene individual também não é das melhores. E, por conseguinte, com as chuvas que se arrastam ainda no tempo em que nos encontramos, estamos no tempo chuvoso, essas fezes são arrastadas pelas águas da chuva para os rios, poços, lagoas, cacimbas, onde a população se abastece de água. Então, essa água é contaminada. Portanto, as pessoas continuam a beber esta água.
DW África: A cólera provocou em Angola 609 mortes desde o início do ano e o surto começou a meio ano. E o setor da saúde em Angola está a fazer o seu trabalho. Na sua ótica, o que seria importante neste momento?
DC: O que é importante, neste momento, é o governo oferecer água potável, portanto, água tratada por cisternas. E tem de ser uma das vias para se poder controlar a epidemia da cólera. Se não for feita a distribuição de água por via de camiões cisternas e fazer-se o controle da defecação ao ar livre, nós teremos durante muito tempo casos de cólera em Angola.
DW África: E, de um modo geral, pode dizer-se que as autoridades sanitárias angolanas falharam ao não terem levado a cabo medidas eficazes de prevenção?
DC: Essa crítica não é muito válida porque a cólera está relacionado com a falta de água, que não é [competência] das autoridades sanitárias. [Porém, sim] do Ministério da Energia e Águas, do Ministério do Ambiente, que não controla a defecação ao ar livre. Ao setor da saúde simplesmente cabe a responsabilidade de imunizar ou de fazer a gestão do pessoal que está doente.
DW África: Neste momento em que os casos de cólera aumentam em número em Angola, o setor de saúde sente muito stress e falta de meios. Como é que descreveria a situação?
DC: O setor da saúde não tem falta de medicamentos. Não há falta de soros de reidratação, porque a cólera se trata simplesmente com hidratação. Não há falta de material como luvas e até mais borboletas, etc. E também não há superlotação das unidades sanitárias. Não há colapso da unidade sanitária. Não há.