Crianças a mendigar na Namíbia? Alertas foram ignorados
24 de maio de 2025Recentemente o antigo Presidente da Namíbia, Hifikepunye Pohamba, criticou a presença de crianças angolanas nas ruas de Windhoek, que atravessam a fronteira para pedir dinheiro. Pohamba apelou à criação de políticas para evitar o constrangimento, que dá uma má imagem ao país.
Xavier Kaulinanga, em nome da Comissão Diocesana de Justica, Paz e Integridade da Criação na diocese de Ondjiva, na província do Cunene, afirma que as declarações de Pohamba não representam surpresa, uma vez que o Governo angolano "não se mostra preocupado com o seu povo".
"Que condições de empregabilidade temos para as pessoas que não sabem ler, que não têm capacidade económica e financeira para auto-sustento e para, se calhar, as crianças estarem a estudarem? As família entenderam que fossem à Namíbia onde a moeda tem um peso superior ao da moeda angolana", lamenta.
O diretor das organizações não-governamentais Associação Construindo Comunidades (ACC) e Ame Naame Omunu (ANO), no município dos Gambos, província da Huila, o padre Jacinto Pio Wacussanga, também não ficou surpreso com as declarações do antigo estadista namibiano.
Lembra que em 2012, a sociedade civil chamou a atenção para as consequências da seca na região Sul, mas foram vistos como inimigos do Estado e do Governo.
"Fomos alertando e estão aí os resultados. Até hoje não há nenhum programa de gestão da crise climática no sul e centro de Angola. Temos os onze compromissos da criança, mas nada funciona em relação à crise que estamos a enfrentar. Temos o pacto internacional dos direitos económicos sociais e culturais em que Angola é parte signatária, mas infelizmente o nosso Estado 'manda passear' estas ferramentas todas de que é signatário", argumenta.
Cubango e Cuando na mesma situação
O problema de crianças emigrantes acontece também a partir das províncias do Cubango e do Cuando.
Alberto Viagem, diretor da ONG "AJUDS", na província do Cubango, considera que a situação é consequência da disparidade de desenvolvimento entre Angola e Namíbia.
"Porque nestes situações a parte pobre tende a buscar melhores condições de vida. Trata-se igualmente de crianças fora do sistema do ensino. Entretanto, é um problema que se torna extensivo ao território vizinho, no caso concreto, a Namíbia."
A DW contactou o setor social, mas este remeteu o caso ao Ministério da Ação Social. A DW tentou também ouvir o Ministério da Ação Social, Família e Igualdade do Género, mas sem sucesso.
Ainda assim, Xavier Kaulinga dá razão aos Governos e acredita que mesmo que tenham iniciativas, a situação dos vizinhos da Namíbia ultrapassa as suas possibilidades.
"Pode até haver vontade, mas não têm autonomia política do ponto de vista administrativo e do ponto de vista financeiro. Tudo depende de Luanda", defende.
Para o Padre Pio Wacussanga o problema não se resolve apenas com vontade política, mas com sensibilidade.
"Enquanto realmente o coração humano não se converter, não haverá, infelizmente, magia que trave a demanda do interior para as cidades e da parte centro e sul para a República da Namíbia", alerta.