Gás lacrimogéneo e tiros: Jovem baleado em Maputo
18 de março de 2025A agitação, na Casa Branca, a cerca de 500 metros das portagens de Maputo da estrada Nacional 4 (N4), principal estrada que liga à fronteira de Ressano Garcia, com a África do Sul, começou pela manhã, com populares a assinalar, na rua, o denominado “Dia dos Verdadeiros Heróis do Povo Moçambicano”, instituído unilateralmente pelo ex-candidato Venâncio Mondlane.
No local, populares relataram que a polícia entrou no bairro, junto à N4, durante a manhã, baleando mortalmente na cabeça um dos jovens, lançando gás lacrimogéneo e disparando vários tiros.
“É um feriado normal, ninguém fechou a estrada. De repente aparece o Conselho Municipal e a UIR, começam a disparar sem perguntar nada”, descreveu um dos jovens, de máscara, protegendo-se do gás lançado pouco antes e garantindo que estavam na rua a limpar e a festejar o denominado “Dia dos Verdadeiros Heróis do Povo Moçambicano”.
Outro jovem explicou que o colega “não estava a fazer nada” e foi atingido a tiro “a sair de casa”, o que provocou a revolta dentro do bairro, que rapidamente passou para a N4, arremessando pedras contra viaturas, incluindo da polícia, e mais tarde tentando vandalizar um espaço comercial, que levou a nova intervenção policial.
“Eles [polícia] deram logo um tiro na cabeça, a sair, sem perguntar (...) Nós não fizemos nada”, garantiu o jovem.
Corpo de jovem carregado para estrada em protesto
Cerca das 11:30 locais, um grupo de jovens carregou o corpo da vítima mortal para o separador central da N4, cortando a espaços o trânsito no local, com elementos da Unidade de Intervenção Rápida (UIR) da polícia moçambicana a realizar por várias vezes disparos de gás lacrimogéneo e tiro real, tentando, sem sucesso, desmobilizar o protesto e recolher o corpo.
Ao fim de uma hora de tensão, a intervenção policial conseguiu afastar os jovens do corpo da vítima, que foi rapidamente removida por elementos do Serviço Nacional de Investigação Criminal (Sernic), apesar da resistência dos populares.
O ex-candidato presidencial Venâncio Mondlane, que não reconhece os resultados das eleições gerais de 09 de outubro, apelou para o país parar hoje, designando 18 de março como o “Dia dos Verdadeiros Heróis do Povo Moçambicano”.
Este apelo levou muitos a encarar o dia de hoje como feriado, com a cidade de Maputo com um reduzido movimento, anormal para uma terça-feira, enquanto em alguns bairros periféricos a circulação está condicionada, com algumas manifestações e agitação social.
No dia 18 de março de 2023, agentes da polícia moçambicana alegaram ter "ordens superiores", nunca esclarecidas, para dispersar grupos que pretendiam realizar marchas pacíficas, em vários pontos do país, em homenagem ao ‘rapper’ de intervenção social Azagaia, que tinha morrido uma semana antes.
Centenas de pessoas também se concentraram hoje no cemitério de Michafutene, recordando nomeadamente Azagaia e Elvino Dias – ambos sepultados no local -, este último conhecido como “advogado do povo”, baleado com vários tiros na noite de 18 de outubro de 2024, em Maputo.
ONG denuncia assassínio de apoiante de Mondlane
A plataforma eleitoral moçambicana Decide denunciou esta terça-feira (18.03) que mais um apoiante do ex-candidato presidencial Venâncio Mondlane foi “sequestrado e assassinado”.
De acordo com a organização não-governamental (ONG), que acompanha os processos eleitorais em Moçambique, Ivo Armando Nhantumbo, de 23 anos, "dinamizador das manifestações em Inharrime", província de Inhambane, no sul do país, foi morto na madrugada de sábado, em circunstâncias ainda por clarificar.
“Ao todo, já são 15 apoiantes de Venâncio Mondlane e um do partido FRELIMO mortos desde dezembro”, afirma a Decide.
No mesmo dia já tinha sido “raptado e assassinado” a tiro, no distrito de Zavala, também na província de Inhambane, João de Deus Nhachengo, “conhecido por suas convicções fortes" no apoio a Mondlane.
A Lusa contactou a polícia de Moçambique para obter esclarecimentos, mas não obteve resposta.