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Bissau: "Nomeação de Braima Camará é estratégia"

7 de agosto de 2025

O Presidente guineense nomeou Braima Camará como novo primeiro-ministro. Em entrevista à DW, jurista diz que, a poucos meses das eleições, esta é uma manobra política para tentar recuperar aliados.

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Político guineense Braima Camará durante uma conferência de imprensa em junho de 2023
Braima Camará foi, no passado, uma das vozes mais contundentes em relação ao chefe de Estado, Umaro Sissoco Embaló, acusando-o de pretender instaurar um regime autoritário no paísFoto: Alison Cabral/DW

Braima Camará vai assumir a liderança do Governo guineense de acordo com um decreto presidencial divulgado esta quinta-feira (07.08).

Até recentemente, enquanto líder de uma das alas do Movimento para a Alternância Democrática (MADEM-G15), Braima Camará foi uma voz muito crítica em relação ao chefe de Estado, Umaro Sissoco Embaló. Entretanto, mudou de postura e chefia agora o governo de iniciativa presidencial.

Em entrevista à DW, o jurista Fransual Dias diz que esta nomeação é uma manobra política do Presidente Sissoco Embaló para "recuperar aliados" e reforçar a sua posição antes das eleições legislativas e presidenciais agendadas para 23 de novembro. Admite,  no entanto, que as eleições possam ser adiadas.

DW África: Como interpreta a nomeação de um novo primeiro-ministro a poucos meses das eleições, tendo também em conta o atual momento político na Guiné-Bissau, marcado pela instabilidade governativa?

Fransual Dias (FD): Esta é uma tentativa de Umaro Sissoco Embaló de querer recuperar os seus aliados que o levaram à Presidência da República, a começar por Braima Camará, atendendo à aproximação das eleições marcadas. Sissoco sabe que, se não conseguir recuperar esses aliados, não terá condições para fazer face ao PAIGC e ao seu candidato.

Guiné-Bissau, 2021
Em 2019, Braima Camará, enquanto líder do MADEM-G15, foi uma das figuras determinantes para convencer o eleitorado a eleger Umaro Sissoco Embaló como Presidente da RepúblicaFoto: MADEM-G15

Penso que é nessa lógica que essa nomeação aparece. Só não sei como é que os demais aliados vão conseguir embarcar nesse grande barco.

DW África: Em que sentido é que Braima Camará é um trunfo para Sissoco?

FD: Braima Camará é da etnia mandinga, que é a terceira etnia mais populosa. Olhando para esta equação, é fácil perceber por que é importante recuperar esses aliados, atendendo que o PAIGC é um partido de dimensão nacional, de dimensão histórica também, tem raízes profundas, e seria muito difícil [defrontá-lo]. Acredito que o próprio Umaro Sissoco Embaló não está em condições de deixar a Presidência da República. Não está preparado para isso.

Líder do MADEM-G15 quer respeito aos estatutos do partido

DW África: O que se pode esperar, em termos políticos e institucionais, da nomeação de Braima Camará como primeiro-ministro, a poucos meses das eleições legislativas e presidenciais agendadas para 23 de novembro?

FD: Em termos institucionais, praticamente nada. Não vai acontecer nenhuma reforma. Não será possível fazer reformas num período de quatro meses. Em termos políticos e sociais, [...] haverá muitas reticências.

Não se tratará de uma agenda para a criação de condições de desenvolvimento, não estou a ver isso. Poderá, sim, ser uma agenda de salvação de cada aliado, neste caso a começar por Sissoco e Braima Camará. Mas penso que nem toda a gente embarcará nessa lógica, a começar pelos próprios aliados de Braima Camará que enfrentaram Sissoco, atendendo também ao curto espaço de tempo em que se está a tentar fazê-lo. A menos que se venha a criar condições para o adiamento das eleições. Tudo indica que poderá ser este o caminho.

DW África: Como avalia a legalidade do processo de nomeação de um novo primeiro-ministro?

FD: Os dois decretos [de demissão do anterior governo de iniciativa presidencial e de nomeação do primeiro-ministro] não disseram nada. Não temos o preâmbulo. As condições não foram explicadas, o que é imperativo quer para a demissão, quer para a nomeação do novo governo e do novo primeiro-ministro. A Constituição estabelece claramente que o Presidente pode demitir o Governo em caso de grave crise. Até agora, nós não vemos nenhuma crise que fosse sustentada.

Presidente da Guiné-Bissau na assinatura do acordo de paz para a Líbia, em fevereiro de 2025
Sissoco Embaló deverá lutar em novembro para uma reeleição e um segundo mandatoFoto: Amanuel Sileshi/AFP

Por outro lado, neste momento, a aferição da legalidade não se pode questionar, porquanto estamos perante a caducidade das instituições. A própria legitimidade do Presidente da República está em causa.

Penso que o novo primeiro-ministro terá de dizer claramente em que situação vai ter de gerir o país e qual é a sua visão para garantir que a normalidade [institucional] possa ser retomada.

DW África: Considera que há condições efetivas para a realização das eleições de novembro?

FD:  O Gabinete Técnico de Apoio ao Processo Eleitoral afirmou, há algum tempo, que não havia dinheiro para a impressão dos cadernos eleitorais, que é o primeiro passo. O recenseamento ainda está a decorrer na Europa, o que significa que o processo não está concluído, embora já tenha terminado na Guiné-Bissau.

Tinha-se falado que, desta vez, a Guiné-Bissau iria organizar as eleições com meios próprios, mas estamos a ver que não será o caso.

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