Ataque na EN14 provoca alerta no sul de Cabo Delgado
14 de abril de 2025Homens armados bloquearam a circulação na Estrada Nacional 14 (EN14), entre Ancuabe e Montepuez, em Cabo Delgado, no último sábado (12.04), exigindo quantias entre 10 mil e 200 mil meticais (140 a 2.800 euros) pela libertação de reféns e dos veículos interceptados. Analista vê com preocupação o que se teme ser uma "nova frente" de ações terroristas, no sul de Cabo Delgado.
Extorsões a viajantes
Um dos passageiros capturados e posteriormente libertado contou que os agressores envergavam uniformes semelhantes aos das forças especiais do Exército moçambicano.
"Estava num camião, a vir de Montepuez. Chegámos a uma aldeia próxima de Muaja e vimos, de repente, um camião a arder, carregado de madeira. Logo após, surgiu um grupo de homens com fardas de comando, mas sem a habitual boina vermelha, armados com metralhadoras e facas. Mandaram o nosso motorista sair. Depois de ele obedecer, disseram que não sairia dali sem pagar 200 mil meticais", relatou o passageiro, sob anonimato.
Outra testemunha, que também pediu para não ser identificada, confirmou a extorsão por parte dos atacantes.
"Cerca de seis homens bloquearam a estrada. No carro onde eu seguia, quatro deles aproximaram-se, enquanto os outros permaneceram nas bermas. Cobraram-nos dinheiro", contou.
Polícia ainda não identificou autores
O ataque interrompeu a circulação na EN14 por várias horas, entre sábado e a manhã de domingo.
A Polícia da República de Moçambique (PRM), em Cabo Delgado, confirmou a ocorrência. Contudo, segundo a porta-voz da corporação na região, Eugénia Nhamussua, ainda não foi possível identificar os autores.
"Neste momento, não temos muito a avançar. Fala-se de supostos terroristas, mas não podemos confirmar, porque não vivenciámos diretamente os factos. São relatos que nos chegam de terceiros", referiu Nhamussua em declarações aos jornalistas.
A PRM assegura que a circulação foi restabelecida e decorre com normalidade. As Forças de Defesa e Segurança prometeram divulgar mais informações assim que estiverem disponíveis.
A porta-voz da PRM em Cabo Delgado frisou que decorrem investigações para apurar a autoria dos ataques. "Assim que for possível, e tivermos rostos e nomes, convocaremos a comunicação social para partilhar essas informações sobre quem está realmente a criar esses desmandos ao longo das nossas vias", acrescentou.
Ataque pode precipitar crise
É a primeira vez que ataques desta natureza ocorrem nesse troço da EN14, o que levanta receios quanto à possível expansão da atividade de grupos armados para o sul da província.
O analista político Aly Caetano considera que os recentes ataques colocam em causa a narrativa oficial sobre o enfraquecimento dos grupos terroristas: "Em primeiro lugar, isso demonstra que a narrativa segundo a qual os líderes terroristas já teriam sido eliminados e o grupo estaria enfraquecido pode não ser totalmente verdadeira", comenta.
Para Aly Caetano, os incidentes indicam também que os terroristas poderão estar a "alargar a sua zona de atuação para Ancuabe e Montepuez, ou seja, mais para o sul de Cabo Delgado."
O analista alerta para as implicações económicas e sociais de bloqueios ao longo das estradas de cabo Delgado, particularmente, da via que liga Ancuabe a Montepuez.
"Vamos ter produtos a não ser escoados de e para Montepuez, numa altura em que a estrada para Nampula já não é transitável. Isso terá consequências diretas no aumento do preço dos produtos e no agravamento da tensão social na região", adverte.
Na semana passada, o governador provincial de Cabo Delgado, Valige Tauabo, já havia alertado para a presença de grupos desconhecidos a extorquir automobilistas em várias estradas da região.
No entanto, Tauabo afastou qualquer ligação desses grupos aos terroristas que atuam na província desde 2017, sublinhando que os métodos são distintos.