Armas de longo alcance: Fundo alemão para drones ucranianos
3 de agosto de 2025Prédios em chamas e nuvens de fumo sobre a capital ucraniana, Kiev. Quase todos os dias, a Rússia ataca o país com drones e mísseis. Em resposta, a Ucrânia está a defender-se e é bem possível que, nestes ataques, estejam a ser usados drones produzidos com fundos alemães.
"Este é o início de uma nova forma de cooperação militar-industrial entre os nossos países, que tem um grande potencial", disse o chanceler alemão Friedrich Merz no final de maio, quando o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky visitou Berlim.
Nessa altura, os ministérios da defesa dos dois países assinaram um acordo: A Alemanha financiaria armas de longo alcance, mas estas seriam produzidas na Ucrânia. Dois meses depois, não foram divulgados muitos pormenores sobre o acordo. "O processo está em curso", disse à DW Mitko Müller, porta-voz do Ministério da Defesa alemão, no final de julho.
Em junho de 2024, a Dinamarca tornou-se o primeiro Estado membro da NATO a envolver-se na indústria de armamento ucraniana.
Os fabricantes de armas alemães estão representados na Ucrânia, sendo a Rheinmetall, um fabricante de armas com sede em Düsseldorf, provavelmente o mais visível.
Uma "enorme mudança" do lado alemão
"Estamos a assistir a uma grande mudança na abordagem da Alemanha em relação à Ucrânia, uma abertura total", disse à DW Ihor Fedirko, diretor executivo do Conselho Ucraniano da Indústria de Defesa (UCDI).
Os investimentos diretos do Governo alemão na produção ucraniana de drones e mísseis são ainda uma novidade. De acordo com o jornal alemão Die Welt, a Alemanha tenciona financiar cerca de 500 drones An-196 Liutyi, veículos aéreos não tripulados de ataque unidirecional. Os meios de comunicação ucranianos sugerem que cada drone custa cerca de 200.000 dólares (175.000 euros).
O drone foi desenvolvido na sequência de uma cooperação entre a Turquia e a Ucrânia. O An-196 Liutyi "já estava bastante avançado no seu desenvolvimento e testes", explica o perito militar Gustav Gressel, antigo membro sénior do Conselho Europeu de Relações Externas.
No entanto, uma percentagem muito elevada destes drones é abatida, sublinha Gressel, porque voam bastante devagar, a velocidades semelhantes às dos modelos russos comparáveis.
Além dos fundos, a Ucrânia espera também contar com o know-how alemão. "Faltam-nos tecnologias de ponta", explica Fedirko, referindo-se à engenharia de ponta. "Isto afecta a base de componentes. Equipados com este tipo de conhecimento, poderíamos modernizar-nos mais profundamente e tornarmo-nos mais eficientes", afirma. A Alemanha dispõe destas tecnologias.
Atualmente, a Ucrânia está a pedir a todos os seus aliados tecnologia que permita a aquisição de armas de longo alcance, continuou Fedirko.
"Estamos a falar de um alcance entre 500 e 1.000 quilómetros", explica. "Algumas delas [as armas] já conseguem atingir alvos a mais de 2.000 quilómetros de distância."
Produção de drones na Ucrânia
Muitas das empresas alemãs que estão a tornar-se mais ativas na Ucrânia são empresas em fase de arranque, na sua maioria sediadas na Baviera. Um exemplo é a Quantum Systems, uma empresa especializada em dados aéreos e no fabrico de sistemas aéreos não tripulados.
Fedirko descreve esta empresa como o "melhor cenário possível" do tipo de cooperação que a Ucrânia pretende.
Fundada em 2015, a Quantum Systems tem vindo a fornecer os seus drones de reconhecimento Vetor ao exército ucraniano desde 2022. Uma caraterística especial do Vetor é a sua capacidade de descolar e aterrar verticalmente.
"Somos a única empresa ocidental a produzir drones de reconhecimento onde eles são mais urgentemente necessários: na Ucrânia", diz Sven Kruck, co-diretor executivo da Quantum Systems. A empresa emprega cerca de 200 pessoas na Ucrânia e está a crescer, estando prevista a abertura de uma segunda unidade de produção em setembro.
Em meados de julho, a Quantum Systems anunciou que iria também adquirir uma participação de 10% na Frontline, um fabricante ucraniano de drones. Terá a opção de aumentar essa participação para 25% durante o próximo ano.
"A Frontline é especializada em soluções técnicas para operações de reconhecimento e de ataque. Os seus sistemas são atualmente utilizados por 41 unidades militares na Ucrânia", explicou Kruck. "Vemos potencial de cooperação, especialmente no desenvolvimento da defesa por drones". No entanto, acrescentou, a sua empresa não planeia entrar em drones de combate.
Os drones de combate estão a ser fabricados por outra empresa alemã, a Helsing. A empresa bávara já entregou milhares de drones à Ucrânia e, em fevereiro passado, anunciou um novo contrato para mais de 6000 drones de ataque HX-2.
Helsing não respondeu aos pedidos de informação da DW para obter mais pormenores.
No entanto, por muito que os ucranianos possam estar satisfeitos com o financiamento e os investimentos da Alemanha em drones, a procura continua a ser muito superior à oferta.
Ucrânia, um campo de ensaio para armas
Gressel argumenta que a Ucrânia precisa de fornecimentos de boa qualidade. Estes só podem ser produzidos de forma económica na própria Ucrânia.
O mesmo argumento aplica-se aos mísseis, como os mísseis de cruzeiro Taurus, uma arma que os alemães não estão atualmente dispostos a fornecer. No entanto, Gressel sugere que a cooperação com empresas alemãs poderia permitir o fornecimento de algumas peças.
Isso poderia aumentar o alcance dos mísseis de cruzeiro Neptune da Ucrânia, com motores mais eficientes do ponto de vista energético, que poderiam voar mais longe com a mesma quantidade de combustível, e sensores mais precisos, que ajudariam a estabelecer alvos em terra. No entanto, ainda não foi tomada uma decisão sobre este tipo de fornecimentos.
A Alemanha não só está mais disposta a investir na Ucrânia como também a partilhar conhecimentos. No início da guerra, havia receios de que a moderna tecnologia alemã pudesse cair nas mãos dos russos e dúvidas sobre a fiabilidade do lado militar ucraniano, explica Gressel. Esta é uma das razões pelas quais a Ucrânia recebeu inicialmente armamento mais antigo.
Mas o cenário mudou. Em parte, deve-se ao facto de a Ucrânia produzir agora armas modernas e poder competir com outros fabricantes.
A zona de combate ucraniana está repleta de “jammers”, dispositivos de interferência e sistemas de defesa aérea, o tipo de coisas que não se encontram em mais lado nenhum, nem num campo de treino da NATO, nem em simulações na Alemanha ou nos EUA.
A indústria da defesa reconhece este facto, diz Gressel.
Kruck, da Quantum Systems, confirma-o. “O desenvolvimento de drones é um jogo do gato e do rato”, disse à DW. "Só quem está no local pode adaptar-se a todas as mudanças constantes. As nossas percepções da Ucrânia fluem diretamente para o nosso desenvolvimento de produtos, que disponibilizamos a todos os nossos clientes em todo o mundo."
O trabalho da sua empresa na Ucrânia é visto por ele como um “projeto emblemático” e quer encorajar outros a seguir esses passos.
Fedirko, da UCDI, gostaria de ver este tipo de cooperação ir ainda mais longe. “A Alemanha é um país com uma burocracia tipicamente europeia”, admite. "Por isso, é preciso tempo para fazer as coisas. Mas quando os alemães dizem que estão a fazer alguma coisa, nós, ucranianos, sabemos que vai ser feito."