50 anos da DW África: "Por aqui passaram grandes vozes"
17 de abril de 2025Reinhold Meyer foi uma das figuras que marcaram, de forma decisiva e inequívoca, a génese e o desenvolvimento da DW Português para África e que, durante muitos anos, foi o chefe de redação, até ao final de 2005.
Hoje tem 81 anos e vive nos arredores de Colónia, cidade que, durante cinco decénios, foi sede da DW, antes da emissora estatal da Alemanha se mudar para a cidade de Bona, em 2003. Meyer recorda, com nostalgia e orgulho, os tempos em que a Deutsche Welle - com ele próprio na proa - decidiu produzir os primeiros programas dirigidos aos cinco novos países independentes de língua portuguesa em África.
DW África: Dr. Reinhold Meyer, bem-vindo! É bom tê-lo connosco! Conte-nos: Como surgiu a ideia de criar a DW Português para África?
Reinhold Meyer (RM): Isso teve, evidentemente, a ver com os acontecimentos históricos e políticos nos países africanos de língua portuguesa. Estávamos em meados da década de 1970, e os países africanos de língua portuguesa tinham recentemente conseguido libertar-se do colonialismo. Os movimentos armados de libertação tinham muita visibilidade e geravam muita atenção no continente africano e no mundo em geral. Nós, na DW, sentíamos a necessidade de reagir aos novos ventos que sopravam. Concluímos, na altura, que devíamos ter em conta as novas realidades, criando programas específicos em língua portuguesa destinados a esses novos países africanos, os denominados PALOP.
DW África: Quais as maiores tarefas e os maiores desafios que se impunham aos pioneiros do projeto?
RM: Inicialmente, atravessámos uma fase bastante difícil em termos de organização e sobretudo a nível financeiro. Não foi nada fácil avançar com a nossa ideia É preciso dizer que, na altura, já havia um programa em português para Portugal. E nesse programa também já se focava, de forma residual, os temas referentes aos PALOP, mas da perspetiva de jornalistas oriundos sobretudo de Portugal.
Na nossa opinião, o que nós precisávamos, nesse momento, eram vozes mais autênticas, ou seja, vozes de jornalistas oriundos dos novos países africanos: Moçambique, Angola, Guiné-Bissau, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe. Uma das nossas primeiras tarefas era, por isso, encontrar e recrutar colaboradores desses mesmos países africanos de língua portuguesa. O meu primeiro passo nesse sentido foi viajar para os ditos países e iniciar contactos com as emissoras oficiais nos PALOP para recrutar jornalistas para a DW.
Havia, no entanto, o seguinte problema: As emissoras desses países também tinham falta de jornalistas, e por isso nem sempre era fácil trazer bons colaboradores para a Alemanha. Mesmo assim, conseguimos construir relações muito boas com as emissoras parceiras. Eu pessoalmente viajei aos PALOP e mantive negociações com as rádios parceiras e com possíveis candidatos. Foi assim que tudo começou.
DW África: Nos primeiros tempos quais eram os temas em destaque na DW Português para África?
RM: É evidente que as guerras civis, travadas em Angola e Moçambique, ocupavam, nos primeiros tempos, uma parte significante das nossas atenções. As condições políticas, económicas e sociais nos PALOP, de um modo geral, não eram nada fáceis, o que nos levou a produzir muitos programas especiais e ouvir muitas vozes diferentes sobre os diferentes temas.
Depois, quando acabaram os sistemas monopartidários, enviámos os nossos jornalistas aos países para fazerem cobertura das campanhas eleitorais e das eleições. Esse trabalho contribuiu, e muito, para a crescente popularidade da Deutsche Welle nesses mesmos países, o que nos orgulha bastante.
DW África: A Deutsche Welle conseguiu conquistar grandes audiências nos PALOP?
RM: Sim, sabíamos que éramos ouvidos em onda curta e através das nossas rádios parceiras, porque recebíamos muitas cartas dos nossos ouvintes nos PALOP. Acresce que os nossos jornalistas, que, entretanto, tinham vindo trabalhar para a Alemanha, eram muito conhecidos nos seus países de origem. As suas vozes eram muito populares nos PALOP e as pessoas escreviam cartas dirigidas também a esses nossos jornalistas, para se manterem em contacto com os mesmos, pois as suas vozes tinham grande impacto. Isso contribuiu para o aumento da popularidade da Deutsche Welle em todos os PALOP.
DW África: Nos primeiros tempos, a redação Português para África teve de se impor perante outras redações africanas com mais "peso" na DW?
RM: Sim, de facto, os outros programas da DW, na altura, tinham um avanço, porque, como é sabido, os outros países, francófonos e anglófonos, tinham atingido a sua independência muito antes, no início dos anos 1960. Os PALOP conquistaram a sua independência muito mais tarde, na sequência da "Revolução dos Cravos" em Lisboa, em 1974.
Acresce que a língua portuguesa, na altura, estava um pouco "na sombra" de outras línguas, como o inglês ou o francês, mas também de línguas africanas como o suaíli, hauçá ou amárico, línguas muito usadas e conhecidas no continente africano. Foi por isso que as respetivas redações tinham mais meios financeiros à disposição do que a redação em Português para África.